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Lugar de compra no carrinho ou no bolso?
As prateleiras cobertas de novidades e a imensa quantidade de produtos expostos nos supermercados são uma verdadeira tentação aos olhos. Dificilmente alguém que esteja lendo esta matéria já não teve vontade de comer aquele chocolate ou levar para casa um produto de higiene pessoal ou mesmo um cosmético durante as compras. O orçamento apertado muitas vezes faz com que a razão fale mais forte e as necessidades básicas é que acabam prevalecendo: leva-se o necessário e o supérfluo fica para uma próxima ocasião. Mas o que dizer quando o desejo é mais forte e a pessoa acaba levando o produto escondido no bolso ou na bolsa e deixa o local sem pagar por ele? Aí o desejo já não é mais desejo e ganha outro nome: furto. Esta é uma rotina com que convivem todos os dias os comerciantes de Candelária, que contabilizam prejuízos com pequenos furtos ocorridos no interior de suas lojas. Com freqüência a pessoa que furta é surpreendida, mas estima-se que um grande volume de mercadoria saia das lojas de maneira despercebida.
Durante a semana, a reportagem da Folha visitou três grandes supermercados da cidade e os entrevistados foram unânimes ao apontar as preferências dos clientes-ladrões: aparelhos de barbear, pilhas, isqueiros, itens de cosméticos e perfumarias, chupetas e pilhas, quase sempre das marcas mais caras. Estes entre outros objetos fazem parte de uma modalidade de furto, a que a pessoa leva o produto escondido na roupa ou em sacolas; são geralmente produtos pequenos em tamanho mas com alto valor agregado. A outra modalidade é aquela em que o gênero alimentício é consumido dentro da própria loja, sem pagar. Este tipo de delito quase sempre é descoberto tarde demais, durante a limpeza do local, quando aparecem as embalagens vazias abandonadas sob as prateleiras ou nos corredores. Neste quesito, a preferência é para iogurtes, chocolates e doces, nesta mesma ordem de preferência.
O QUE FAZER? – Os administradores dos supermercados garantem que o método inibitório é o que tem maior eficácia. Funcionários são orientados a observar todas pessoas dentro da loja, afinal, entre os que furtam há adultos e também crianças. Algumas características, segundo Ângelo Casemiro, gerente do super Imec, acabam denunciando a intenção de furtar – a pessoa fica muito tempo olhando as prateleiras, vagando pelo mercado e não compra nada. “Quando a gente percebe, fica cercando de longe. Isso acaba inibindo a pessoa, que vai embora sem furtar”, explica o gerente. “Por vezes, ao notar que estão sendo vigiadas, as pessoas que já esconderam algum produto sob as roupas acabam levando de volta à prateleira”, emenda. O Imec de Candelária, a exemplo das demais 10 lojas, terá em breve uma central de vigilância com funcionário treinado exclusivamente para coibir os pequenos furtos.
E quando o ladrão é flagrado? “Quando o furto ocorre e é descoberto e alguma pessoa é flagrada, nem sempre a polícia é acionada”, responde Carmem Dummer Wollmann, do super Wollmann. O problema, segundo ela, é que para fazer o registro do boletim de ocorrência um funcionário pode perder um bom tempo na delegacia, além da incômoda tarefa de arrolar testemunhas, coisa que ninguém quer. “É melhor ‘negociar’ com a pessoa para que devolva o produto, evitando correria”, ratifica. Os demais entrevistados seguem a mesma linha de raciocínio.
Para tentar coibir a prática, as câmeras de vigilância surgem como grandes aliadas dos supermercadistas. Em dois dos três grandes supermercados o monitoramento por câmeras já existe. No outro, deverá ser instalado até a metade deste ano. Enquanto isso, os funcionários e fiscais do super é que fazem o serviço. “Por vezes, os próprios clientes denunciam os furtos”, ressalta. Embora o valor de alguns produtos seja pequeno, o dirigente se diz indignado com o fato de ter pelo menos 1.000 pequenos objetos levados sem pagar de sua loja todo o mês. “Não importa o valor e nem o quê se está levando. Se não pagou pelo produto, não é correto levar ou mesmo consumir aqui dentro”, diz. Quando uma pessoa é flagrada furtando, os funcionários a abordam, recuperam o produto, “chamam a atenção” e avisam que a partir de então ela não é mais bem-vinda na loja.
Resistência e oportunismo
Os armários disponibilizados na entrada dos supermercados para o depósito de bolsas e sacolas não constituem um fato novo, mas existe resistência por parte de clientes em utilizá-los. Muitos insistem em levar junto suas bolsas ou sacolas enquanto fazem compras e, ao serem interpelados por funcionários, adiantam que não vão roubar nada e saem do local dizendo que não voltam mais. Crianças comendo doces ou bebidas lácteas seguidamente são vistas pelos corredores. “Isto não quer dizer que os pais não irão pagar pelo produto, mas a estatística escondida sob as gôndolas acusa que 90% não paga mesmo”, diz um supermercadista.
Um dado interessante revelado durante as entrevistas é que são em feriados como Páscoa e Natal que se acentuam os pequenos furtos. O frio também é um aliado dos clientes-ladrões, já que o uso de japonas, jaquetas e capotes aumenta a camuflagem, além de permitirem o surrupio de objetos maiores. Nesta época também surge um novo item na lista de preferência: bebidas alcoólicas, como vinhos e uísques. Mas seja na estação que for, às sextas e aos sábados as ações se intensificam, e a preferência dos oportunistas é durante o horário de pico, quando se misturam aos clientes comuns, o que dificulta o monitoramento.
Na maioria das vezes os pequenos furtos são praticados por pessoas necessitadas, mas não são raros os casos de pessoas das classes média e alta flagradas com a “mão na botija”, evidenciando que desigualdade social e cleptomania andam de mãos dadas pelos corredores deixando a conta para alguém pagar.