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25/08/2009 16:56
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Enxurrada arrasa o Cortado

Cinco anos depois de uma enxurrada deixar rastros de destruição e morte, o município de Novo Cabrais novamente se viu assolado pelo alto volume de águas registrado ao entardecer do último sábado, 22, na localidade do Cortado. O deslizamento de parte do cume de um morro também deixou prejuízos em propriedades do local. Lavouras de fumo, milho e mandioca foram completamente destruídas, fornos e galpões de fumo arrastados pelas águas e até uma casa chegou a ser levada alguns metros pela correnteza. A enxurrada fez o arroio Barriga transbordar e engolir trechos da estrada que liga o Cortado à RST 287.
No dia 6 de março de 2003, a chuva também já deixara um cenário desolador na localidade, mas nada se compara à tragédia que se abateu sobre a família Silva em 2003. Valderi da Silva e seus filhos Valdete, de 16, Vinícius, de 13, e a pequena Valéria, de 6 anos, tiveram sua residência na Linha São João destruída e foram tragados pelas águas do Arroio Barriga, morrendo todos afogados. Na ocasião, moradores mais antigos confirmaram que a enchente foi três vezes maior do que a de 1941, a pior da história do Rio Grande do Sul. No acidente deste sábado não houve vítimas, mas os estragos materiais foram maiores.
O prefeito em exercício Celso Antônio Cerentini encaminhou na manhã desta segunda-feira um pré-relatório dos prejuízos à Defesa Civil do Estado do Rio Grande do Sul. O objetivo é solicitar ajuda oficial para reconstruir propriedades destruídas, reconstruir a estrada principal e recuperar pontes danificadas. Máquinas e equipes da prefeitura, envolvendo todas as secretarias municipais, estão desde a manhã no Cortado trabalhando na recuperação dos danos causados pelas chuvas. Em razão do ocorrido, ontem à tarde Cerentini decretou estado de emergência na localidade.

Família Perde toda a produção de fumo
A propriedade dos irmãos Antônio Ronaldo de Camargo e João Renato de Camargo foi uma das mais atingidas pelo deslizamento do cerro. Dois fornos e dois galpões para secagem e classificação de fumo foram totalmente demolidos pelas toneladas de pedras que desceram a encosta. Segundo os irmãos, que produzem fumo na localidade há 24 anos, somente com o fumo carregado pelas águas o prejuízo soma cerca de R$ 32 mil. Eles tinham estocados 400 arrobas de fumo em folha. Somando os prejuízos com os galpões, fornos e maquinário, Antônio calcula as perdas em aproximadamente R$ 60 mil.
Além destes prejuízos de maior volume, a correnteza levou motores elétricos, aquecedores e classificadores de fumo, prensas e balanças, entre outras ferramentas de menor porte. “Duas caixas de água que tínhamos também foram destruídas. Na enxurrada de 2003 choveu cerca de 70 milímetros e neste sábado foi, pelo menos, seis vezes mais água”, declarou João Renato.

Ônibus ataca a avalanche
Um ônibus da empresa Viação União Santa Cruz que faz a linha Cachoeira do Sul/Cortado foi a proteção de uma das residências da localidade. O veículo estava estacionado em frente à casa e impediu que a avalanche de pedras e barro destruísse a propriedade.
O ônibus trancou o material que desceu do cerro, mas ficou quase soterrado pelos entulhos. Pelo menos três pontes foram danificadas e, em dois trechos, a estrada principal do Cortado desabou dentro do arroio Barriga, impossibilitando o tráfego de veículos. Equipes da Celetro trabalhavam pela manhã para recuperar as redes de energia devastadas pela enxurrada.

Casa foi arrastada pela correnteza
Auri Hopp Pinto, 42 anos, perdeu toda sua produção de fumo e as águas quase carregaram também sua casa de madeira. As 200 arrobas de fumo já estavam comercializadas e lhe renderiam aproximadamente R$ 16 mil, mas a água levou tudo. Pela manhã, familiares tentavam recuperar o que poderia ser reaproveitado do fumo em folha que ficou espalhado por toda a propriedade.
Sua residência foi jogada a cerca de cinco metros de distância e só não foi levada pela correnteza porque foi trancada pela parede de concreto de um forno de secagem. No momento da enxurrada, o agricultor lembra de ter amarrado a filha de oito anos para ela não ser arrastada pela força das águas. O agricultor teve tempo de pegar sua carteira de documentos e abandonar a casa sem poder levar nada no momento que a água começou a descer o morro.
Ele perdeu vários móveis e utensílios domésticos e até reconstruir sua casa, vai morar no galpão de um vizinho próximo ao local da tragédia. “Tenho dois bois e se eu não cortasse as cordas que os prendiam, estariam afogados agora”, relata Auri. A correnteza que desceu pelo cerro levou ainda o seu galpão de armazenagem de fumo. A estrutura media 5,5 metros por 9 metros.

Miguel Fachin sem aula até sexta
Além das localidades de Linha São João e Cortado, também a Linha Pfeiffer e Potreirinho foram duramente castigados pela enchente de 6 de março de 2003. A comissão municipal da Defesa Civila apurou na época prejuízos na ordem de R$ 1 milhão. Ao todo, foram danificadas 60 casas e outras quatro restaram destruídas, deixando pelo menos 50 pessoas desabrigadas. Os prejuízos estimados nas lavouras foram de 225 toneladas. Em cinco anos, dois dias para serem esquecidos, mas que lamentavelmente ficarão na memória de quem presenciou as enchentes.

MIGUEL FACHIN– A Escola Municipal de Ensino Fundamental Miguel Fachin foi atingida em cheio pela avalanche de pedra, barro e água que devastou o Cortado neste sábado e invadiu o terreno e o prédio do educandário. Toda a merenda escolar estocada foi levada pela correnteza. A água levou também 8.000 folhas de ofício e vários outros materiais de expediente. As salas de aula e demais dependências ficaram tomadas pela lama, as pedras destruíram completamente a pracinha de brinquedos e quase levaram junto a ponte que dá acesso à escola.
Hoje pela manhã os moradores próximos improvisaram uma passarela para utilizar a ponte, já que as guardas da estrutura foram arrastadas pelas águas. A secretaria municipal de Educação suspendeu as aulas até esta sexta-feira, quando pretende reconstruir e limpar o que foi atingido pela enxurrada.

RST 287 – O volume das águas do arroio Barriga na última enchente deixou danificado o guard-rail da ponte sobre a RST 287, a poucos metros do grupamento da Polícia Rodoviária Estadual de Novo Cabrais. Boatos que se seguiram davam conta de que a ponte estaria com a estrutura danificada, fato desmentido ontem pelo sargento André Doebber, comandante da corporação. Ainda ontem, a equipe da Santa Cruz Rodovias, concessionária do trecho pedageado, já recuperou a estrutura e o trânsito é normal no local.