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25/08/2009 16:56
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Arremedo perigoso

As grandes empresas e entidades ligadas à produção do cigarro cada vez mais têm adotado a palavra tabaco ao invés do nosso tradicional fumo. Isto porque internacionalmente existe o termo inglês tobacco, e como são os países de língua inglesa que mandam na gente, temos que engolir, ou melhor, tragar isso também. Como fumante que sou, numa destas segundas-feiras inspiradoras da vida estava no ônibus Nova Palma/Porto Alegre percorrendo o longo trajeto entre Cabrais e Candelária ansioso para chegar na redação e fumar o primeiro pito da manhã. Não sei por que, mas estava sem nenhuma paciência para ouvir as titias que vão consultar na capital falar de suas dores uma para a outra. Não, gente, é sério. Preciso abrir um parêntese aqui porque o pessoal inventa cada doença que daria um livro que até poderia se chamar “Novo Compêndio da Medicina Caseira” com o patrocínio da Viação União Santa Cruz.
Vocês já ouviram falar de “cárco dos rim”? Já escutaram o termo “extrair a pênis”? Alguém da sua família já teve “trambósi”? Já passou por uma “celurgia de vesíca”? Teve “furungo na bunda”? O marido já deu um “táio” de foice no dedão? O filho já sofreu de “fimose na orêia”? A vó já teve derrame “celebral”? A costela da criança da vizinha nasceu “pegada”? Seu tio já teve problemas de “ursa no estombo”? Seu cunhado já teve que secar as “morróida”? Nasceu alguma criança na família porque o rapaz esqueceu de usar a “camisinha de vento”? Pois é. São centenas de denominações para doenças e  não-doenças e afins, os assuntos preferidos da turma do Nova Palma/Porto Alegre. Eu recomendo uma viagem destas, vale a pena cada centavo da passagem, mas prefira as segundas-feiras. Fecha o parêntese.
Mas, voltando ao assunto, ao olhar para as plantações de fumo da Vila Botucaraí me surgiram dúvidas sobre quais as denominações que decorrerão deste processo evolutivo em substituir fumo por tabaco. Em primeiro lugar, pensei que o substantivo tabaco devesse ganhar um co-irmão verbo, tipo assim: fumo= fumar; tabaco= tabacar. Neste momento, o rasgador de bilhete (leia-se cobrador) chegou para tirar um naco da minha passagem e meio que quebrou meu insight. Mas logo retomei a questão pensando que o advento deste novo verbete em nosso dicionário resultaria em alguns probleminhas, tipo: como enquadrar cada categoria em sua devida função?
Por analogia, se dono de banco é banqueiro, dono de um tabacal seria tabaqueiro. Os funcionários de um banco, que se chamam bancários, seriam os tabacários na plantação de fumo. Adeus, peões! O fumante já tem nome, tagabista, assim como o hábito de quem fuma demais, o tabagismo. Lugar para comprar vai continuar sendo tabacaria, apesar de Candelária, Cerro Branco e Novo Cabrais não ter nenhuma (metrópole conscientizada é isso aí). O negócio é adaptar os supermercados para Supermercado & Tabacaria, com este & gay americanizado. O fabricante de cigarros passaria a se chamar tabacante e os vendedores de cigarros, de tabaquistas. O tabaco não tem feminino porque já utilizaram a palavra tabaca para outra coisa. Se quiserem saber o que é, procurem no dicionário. E por aí vai. Dar uma fumada teria que substituir por dar uma tabacada, que por sua vez significa bofetada. Os chamados picaretas de fumo bem que poderiam ser chamados de tabacudos, apesar de tabacudo significar ignorante e de ignorante eles não têm nada; são pra lá de espertos. E é bom parar por aqui antes que alguém desconfie que eu puxei outro tipo de fumo pra escrever coisas deste tipo. Má nã, é que me tiraram o Gardenal.