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Geral 30/07/2021 16:01
Por: Arthur Lersch Mallmann

COVID – 19: OS BASTIDORES DA VACINA

Profissionais da saúde compartilham suas rotinas e sentimentos ao longo do processo de vacinação em Candelária

  • Priscila Bernardes:
  • Marlene Moura:

À medida que a imunização para Covid-19 avança, passamos a ouvir muito sobre os sentimentos de quem é vacinado. Para muitos, trata-se de um momento de alegria, esperança ou, simplesmente, de alívio. No entanto, nem sempre ponderamos sobre o sentimento de quem está na outra ponta. Afinal, qual é a sensação de ser responsável, direta ou indiretamente, por imunizar uma pessoa para uma doença que, só no Brasil, já matou mais de 550 mil pessoas? Na tentativa de compreender melhor este lado, a Folha conversou com duas profissionais que, em funções distintas, viveram de perto esta realidade.

 

“Eu me sinto como se eu estivesse levando esperança para as pessoas”

Priscila Bernardes é graduada em enfermagem há 15 anos e desde então trabalha no ramo da saúde, acumulando experiência em diversas áreas. Atuando hoje na prefeitura, Priscila coordenou o Centro de Atendimento a Pacientes com Doenças Respiratórias, no prédio da Ulbra, antigo Colégio Concórdia, iniciado em março de 2020. Nos últimos meses, ela vem coordenando as imunizações no município.

Refletindo sobre o atual momento da pandemia em Candelária, no qual a vacinação avança a passos largos e os boletins indicam um baixo número de novos casos, Priscila não esconde o sentimento de orgulho pelo trabalho realizado. “Acho que é um momento histórico, e eu poder fazer parte dele, contribuindo um pouco, já é o suficiente para que eu me sinta feliz e realizada". Não se trata, no entanto, de um esforço individual. Como ela faz questão de enfatizar, toda uma estrutura foi mobilizada, envolvendo profissionais de uma equipe multidisciplinar (médicos, enfermeiros, psicólogos, entre muitos outros). Segundo Priscila, “toda a secretaria se uniu em torno de um objetivo comum: controlar esse vírus”.

O sentimento de relativo alívio contrasta com momentos anteriores de apuro e incerteza. “O momento mais desafiador para mim foi o início, pois não sabíamos o que iria acontecer”, explica Priscila. "Era um vírus desconhecido – até hoje estamos estudando – e acho que exigiu muito de nós, profissionais". Segundo conta, era necessário um planejamento completo de toda a estrutura física, dos recursos humanos, dos atendimentos médicos e da distribuição dos medicamentos. Era fundamental, também, trabalhar com a prevenção, de forma que não houvesse sobrecarga dos leitos hospitalares e, com isso, o colapso do sistema de saúde.

Além dos desafios iniciais, ao longo deste período de enfrentamento ao vírus houve também situações de profunda dificuldade para quem estava na linha de frente. Dentre eles, as mortes que não puderam ser evitadas e a impotência diante da tristeza dos familiares enlutados. Priscila destaca também o momento do pico de casos em março deste ano. No dia 8 de março de 2021, 81 atendimentos foram realizados em um único dia; ainda naquele mês, somente no dia 22 foram registrados 91 casos positivos para a Covid-19. Desse período, Priscila lembra que os atendentes simplesmente não conseguiam vencer a demanda de prover testes, atender aos pacientes e registrar na base de dados do município. Com isso, muitas pessoas buscaram testes particulares e, segundo ela, ao apresentarem os resultados, não dava outra: “positivo, positivo e positivo”.

Quando interrogada sobre o momento mais gratificante neste quase um ano e meio, Priscila não hesita em responder: a chegada das vacinas. Quando as vacinas vieram, segundo Priscila, chegava também a hora de finalmente controlar esse vírus. Cada vacina representa muito. “Eu me sinto como se eu estivesse levando esperança para as pessoas”, revela, estampando em seu rosto o orgulho de ter escolhido a profissão. Haviam chegado, afinal, as ferramentas para que estes trabalhadores pudessem efetivamente cuidar do próximo. Como Priscila faz questão de enfatizar, “enfermagem é cuidar do outro, se colocar no lugar do outro, é poder ajudar”.

Por fim, Priscila faz questão de deixar um recado: “Acho que as pessoas precisam corresponder a tudo que foi feito por elas. Está sendo feita uma campanha nacional. As vacinas estão sendo ofertadas, então façam uso. Venham se vacinar. E não só meio esquema; esquema completo: duas doses. Escolham viver, não o tipo de imunobiológico que irão tomar. Agora é o momento de unirmos ainda mais para reduzirmos a transmissão, e quem sabe, não termos mais esse vírus entre nós”, conclui.

 

“Até hoje, cada paciente que eu vacinei é único

A candelariense Marlene Moura trabalha na saúde pública desde 2016. Técnica em enfermagem, atualmente trabalha na linha de frente da vacinação. Ainda assim, faz questão de esclarecer: “qualquer setor a que eu for designada eu assumo com carinho e amor”. Sempre com um sorriso no rosto, faz questão de falar do amor à profissão: “ir lá no interior, vacinar um acamado, alguém que não tem acesso e explicar a importância da vacina: isso para mim não tem valor financeiro”. A enfermagem, brinca Marlene, “é uma cachaça: ela vicia”.

Perguntada sobre o momento atual, de avanço das vacinações e arrefecimento do contágio, ela resume: “gratidão por nosso esforço estar dando certo”. Na linha de frente ao longo de toda a pandemia, a enfermeira afirma que muitas vezes sentiu impotência e o peso da incerteza. “A chegada da vacina foi um alívio muito grande”. Saber que estão sendo bem-sucedidos na contenção de uma pandemia tão devastadora é uma realização para Marlene. Segundo ela, a estrutura e o respaldo recebido da secretaria da Saúde e de todos os gestores da saúde pública foram fundamentais. A enfermeira destaca, sobretudo, a união da equipe: “para mim, a secretaria de Saúde é uma segunda casa”.

Seu carinho e cuidado ficam muito claros na condução de sua rotina. Marlene conta como preza pelo bom andamento do processo de vacinação, recebendo bem as pessoas e deixando-as confortáveis e bem informadas. A enfermeira lembra bem da ansiedade que a envolveu no primeiro dia de vacinação na cidade. Como era no modelo drive-thru, a fila era composta de carros e, antes das 7 horas da manhã, ela já era significativa. “Eu estava nervosa, querendo que tudo desse certo”, conta. Desde então, Marlene preenche de significado cada novo dia de trabalho na linha de frente da imunização: “até hoje, todo o paciente que eu vacinei é único”.

Marlene também enfatiza a importância do tratamento com as duas doses. Caso ocorram, os efeitos colaterais podem ser contornados com antitérmicos e, como explica a enfermeira, geralmente eles não ocorrem na segunda etapa. Ainda assim, cabe frisar, “nenhum efeito colateral se compara ao próprio vírus”, lembra Marlene.