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25/08/2009 16:56
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Get?lio Vargas e a 2? Guerra Mundial, reflexos em Candel?ria: as sociedades culturais

Por Marli Marlene Hintz, pesquisadora e escritora

Tão logo os primeiros imigrantes anglo-saxões pisaram em solo hoje candelariense, além das dificuldades materiais, perdidos e abandonados nas matas, havia todo um contexto de sofrimento psicológico, espiritual, pois não havia mais o convívio com seus amigos e familiares que haviam permanecido em terras distantes. Mas como o ser humano é dotado de condições para superar também este tipo de obstáculo, os novos habitantes, aqui chegados, logo procuraram se agrupar em torno de novas amizades, tendo, muitas vezes, os vizinhos mais próximos como uma extensão da família, ainda que estes morassem a dez, quinze quilômetros de distância. E não havia outro meio melhor, para isso, do que criar sociedades e clubes, onde pudessem cultivar um pouco de alegria e, principalmente, a união, sem a qual lhes seria difícil a sobrevivência. Esta união reflete-se de duas maneiras até marcantes. A primeira, nos próprios nomes das sociedades, designadas sempre por palavras como união, círculo de amigos, concórdia, etc. A segunda é que, mesmo quando eram sociedades que poderiam realizar disputas, para ver qual a melhor, isso não ocorria. Os corais, as sociedades de bolão, de tiro ou de lanceiros tinham suas atuações com simples apresentações de entretenimento. Nunca uma competição individualizada, onde se salientasse uma ou outra pessoa. E ainda que um determinado esporte o exigisse, a recompensa era compartilhada com todo o grupo ali presente. Um exemplo típico disso eram os jogos de bolão, em que, quando havia apostas, estas giravam em torno de algo como uma rodada de cerveja, disponível a todos os que assistiam. Além disso, o perdedor e o ganhador continuavam os mesmos amigos de sempre, sem cultuar mágoas ou ressentimentos pela derrota, tampouco sentimento de superioridade pela vitória. E assim, em cada nova picada aberta, iam surgindo novos clubes culturais, nos quais seus integrantes se reuniam uma ou duas vezes ao ano, em festividades iniciadas pela manhã e que culminavam com um baile de encerramento. Era também um momento de integração entre as localidades, quando as sociedades visitavam umas às outras, e onde os jovens aproveitavam a oportunidade para conhecer as pretendentes a futuras esposas.
Mas estas sociedades e clubes tiveram um grande impacto negativo quando, em 1942, o Brasil alia-se aos EUA, tomando parte na 2ª Guerra Mundial contra os países do Eixo. Assim como foi exigido a cada pessoa que tinha necessidade de se deslocar a outro município que solicitasse um salvo-conduto, também as sociedades tiveram de efetuar registro na Delegacia de Polícia local, comunicando a sua existência. Em uma correspondência de 22 de junho de 1942, o então delegado do DOPS Plínio Brasil Milano, através de carta-circular enviada a todos os delegados no Estado, exige que lhe seja encaminhado, com a máxima brevidade, a relação de sociedades civis existentes em cada município, bem como o nome dos integrantes das diretorias, além da nominata dos membros e sua nacionalidade, um exemplar do estatuto e do regimento interno. Pedia, ainda, o nome das sociedades que haviam alterado sua razão social e a relação das sociedades estrangeiras fechadas por força da lei.
Dessa forma, temendo represálias ou prisões, as sociedades silenciaram o que tinham de mais belo: o canto, a arte, a alegria, a união. Em vez de clubes sociais, o Estado Novo passou a dar ênfase à Educação moral e cívica para eliminar os perigos do prazer: “A nova Educação física deverá formar um homem típico, que tenha as seguintes características: talhe mais delgado que cheio, gracioso de musculatura, flexível, de olhos claros, ágil (...), dócil, alegre, viril (...), sincero, honesto, puro de atos e de pensamentos”. (Educação Física, n° 73, 1943). No interior do município, no entanto, este novo modelo não funcionou. Surgiram apenas colonos solitários, amedrontados, tristes, para os quais as confraterniza-ções sociais eram sinônimo de crime. E toda musculatura que desenvolveram foi conseguida manobrando o arado, o machado e no carregar e descarregar suas produções agrícolas da roça até a carroça e da carroça ao galpão.

Gulherme Tell - Criada em 31 de julho de 1908, na Linha Curitiba, a Schützenverein Freischütz teve seu nome alterado para Sociedade Esportiva Guilherme Tell em 31 de julho de 1938. Tinha por finalidade cultivar o tiro ao alvo ao ar livre, promover diversões familiares e auxiliar em festividades públicas. Em novembro de 1942, contava com 234 sócios. No entanto, não se deve confundir esta sociedade com a Sociedade Desportiva Atiradores Tell, fundada em 31 de agosto de 1924, na localidade de Linha Sete de Setembro, hoje Palmital, cuja sede era no salão de Frederico Rusch.

Sociedade de Canto Orfeu - Criada em 04 de maio de 1889, a Gesangverein Sängerbund da Linha Facão teve seu nome alterado para Sociedade de Canto Orfeu. Era uma entidade para cultivo do canto de homens, a quatro vozes, para incentivar a arte dramática e outras diversões. Sócio-fundadores: Karl e Albert Jappe, Wilhelm, Ferdinand, Friedrich e Johann Schroeder, Friedrich e Wilhelm Behling, Julius e Augusto Lindemann, Eduard Puff, José Fischer, Christiano Grohe, Albert Burtzlaff, Karl Teichmann, Herrmann Winkelmann, Wilhelm Muller, Andréas Beck e Johann Kollberg.

Clube Concórdia - O Clube Concórdia, na Linha do Sul, criado em 1º de agosto de 1920, tinha por finalidade fomentar o espírito de associação, oferecendo agradável diversão as suas sócias por meio do exercício do tiro ao alvo e de organizações sociais. Para ser sócia do clube, era necessário: maioridade de 14 anos, boa conduta e condição familiar. No ano de 1942, contava com 216 sócias, todas brasileiras.
Na foto à esquerda, a Sociedade de Damas Concórdia, junto aos integrantes da bandinha da Linha Alta. A banda era tida como a melhor existente na época, no município. Seus componentes da esquerda para a direita: Cesário Henrique, Bertholdo Gewehr, Frederico HItz, Albino Ellwanger e seu irmão Bernardo Ellwanger, Prof. Willi Guilherme Ruff, Augusto Hitz e Theodoro Gewehr.