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Geral 04/12/2020 09:31
Por: Odete Jochims

Elza e Mauro Cardoso: referência do tradicionalismo em Candelária

Morte recente de Mauro Cardoso leva a Folha a relembrar a história do casal que fez do Sentinela dos Pampas sua segunda casa

  • Elza e Mauro Cardoso entre familiares
  • Bodas Ouro
  • No dia do casamento uma união que durou 56 anos
  • Elza e Mauro Cardoso 56 anos de união e amor ao tradicionalismo
  • Prenda Xinoca e Peão Xiru
  • O casal com com Luiz Clovis Viera  coordenador da 5º região

Existem histórias que, ao menos a quem as ouve, impressionam pela força dos sentimentos envolvidos. São histórias que levam a pensar que a vida pode até ser passageira, porém o amor que se sentiu parece ser de fato eterno. Assim parece ser a história do casal Elza e Mauro Cardoso, verdadeira referência em toda a 5ª Região Tradicionalista e, especialmente, em Candelária – leia-se CTG Sentinela dos Pampas. Tão forte foi o laço que os uniu que não falta quem acredite que Dona Elza e Mauro eram prometidos um ao outro em casamento desde que nasceram. Embora pudesse realmente ter sido assim, a verdade é um pouco diferente. Pelo falecimento recente de Mauro, esta história merece ser evocada. Para isso, Dona Elza, hoje com 74 anos, recebeu gentilmente a reportagem da Folha para uma entrevista. Porém, mais uma vez, vamos por partes.

Nascidos, ele em Bom Retiro, interior de Candelária, ela no interior de Rio Pardo, pelo fato de as famílias de Dona Elza e Mauro se conhecerem desde antes de seu nascimento, pode-se dizer que sempre se conheceram. O pai de Dona Elza chegava brincar com Mauro, dizendo-lhe que um dia ele haveria de ser seu genro. E disse-o mais de uma vez. Pois bem. Quando Elza tinha 14 anos, em 1960, aconteceu o baile de Natal no salão de Aladim Flores, localizado no trevo de acesso a Cachoeira do Sul. Naquela noite, algo bateu mais forte no peito dos dois jovens, que poucos sabem explicar com palavras. E assim teve início um período de namoro e noivado que durou quatro anos, ao fim dos quais realizou-se o casamento. A cerimônia foi celebrada no dia 11 de julho de 1964, na Igreja São José, em Cachoeira do Sul. Após, o casal mudou-se para aquele município.

Depois de alguns anos vividos em Cachoeira, Dona Elza e Mauro mudaram-se definitivamente para Candelária. Além de plantar, Mauro tinha negócios diversos, como uma oficina de chapeamento. E, logo em seguida, vieram as três filhas do casal: primeiramente, Adriana; em seguida, Jaqueline e, por fim, Simone. A respeito das filhas, Dona Elza comenta que as três só lhes trouxeram alegrias. Referindo-se à perda recente do marido, afirmou que são elas quem lhe dão suporte hoje, durante o período de luto. Sobre a educação que foi dada às meninas, Elza comenta: “Não demos a elas tudo o que elas queriam, mas demos tudo de que elas precisavam”. Dos seis netos que tiveram, Elza lembra com profunda tristeza e saudade de Rodrigo Cardoso, que faleceu em 1994, em decorrência de um aneurisma cerebral.

Além do vínculo especial trazido pela união, Dona Elza e Mauro sempre foram conhecidos por sua forte ligação com o tradicionalismo e com o CTG Sentinela dos Pampas, sendo os dois inclusive parte da história da entidade. Dona Elza conta que sempre se encantou com as tradições gaúchas. Em 1986, ela conseguiu convencer o marido a levá-la ao primeiro baile de aniversário do Sentinela . Sobre a bem-sucedida experiência, ela conta que “Mauro vestiu bombacha pela primeira vez e nunca mais tirou”. Foi a partir de então, com um sentimento de paixão e fortemente identificado com o CTG, que o casal se tornou uma verdadeira referência do tradicionalismo em toda a região. Foram quatro gestões à frente da entidade, e nunca deixaram de integrar a patronagem. Também foram, em 2011, o primeiro casal de Xiru e Chinoca do CTG Sentinela dos Pampas. Já era tradição o casal abrir os bailes, “sempre rodeados pelos jovens”, conta Dona Elza. Mesmo no período que se sucedeu à morte do neto, o casal não deixou de trabalhar pelo CTG. O patrão na época era Clécio Nascimento, que lhes afirmou que, da mesma forma como eles não podiam ficar sem o CTG, a entidade não podia ser privada do trabalho deles. Desse modo, nesse período de tristeza, eles permaneceram ajudando a organizar os bailes. Porém, quando chegava a hora do início da festa, recolhiam-se em casa.

Por sua atuação em prol da causa tradicionalista, Dona Elza recebeu, em 2018, uma comenda de reconhecimento relacionada a mulheres promotoras de cultura. Ela conta que, 15 dias depois do recebimento da distinção, assistiu a uma palestra, ministrada no CTG, sobre empoderamento feminino, para a qual haviam sido convidadas três mulheres: ela, Lurdes Ellwanger como vereadora e Sonia Lang como empresária. A razão da escolha foi o fato de as três serem destaque no município de Candelária.

De 56 anos de união, a força do legado aos jovens e familiares

Sobre a união de 56 anos com Mauro, Dona Elza relata que foi um “período de muitas lutas e vitórias, preocupações e esperanças, e também muito amor, companhia, diálogo e perdão. Porque é assim que se constrói uma união”, afirma. As bodas de ouro do casal foram comemoradas no dia 12 de julho de 2014, no CTG, após uma cerimônia religiosa na igreja Assembleia de Deus, da qual se tornaram membros.

Após um diagnóstico de um câncer de próstata em estágio avançado, teve início, em agosto último, uma luta pela vida de Mauro, travada por toda a família. Durante todo esse tempo, até o dia da sua morte, não sabendo o que de fato tinha, ele nunca perdeu a esperança de encontrar a cura através de uma cirurgia. Porém, depois de um trabalho incansável do médico Wolmar Ercolani, para quem a família não encontra palavras à altura para agradecer, Mauro acabou falecendo no último dia 27 de novembro. Tinha 78 anos. A intensa saudade que Dona Elza sente hoje tem origem, conforme destaca, pelo fato de ela e o marido terem sido sempre “um casal que permanecia junto 24 horas por dia. Se não fosse Deus e o apoio da família, eu não suportaria”, afirma.

Felizmente, uniões como essas deixam um legado que não é tão facilmente apagado: “Ficaram os ensinamentos à nossas filhas e netos. Sempre colocamos acima de tudo a honestidade – em todas as suas formas -, além de muito amor pela família. Amor e uma imensa fé em Deus”. Hoje Dona Elza não se surpreende pelo fato de, mesmo após a partida do marido, continuarem sendo uma referência para o tradicionalismo da região. Isso se justifica pelo fato de terem feito do CTG Sentinela dos Pampas sua segunda casa. Questionada sobre o seu futuro na entidade e mesmo no tradicionalismo, a viúva de Mauro Cardoso afirma que “tudo isso é muito lindo, sim. Mas ao lado dele”, lamenta. Sobre sua volta à entidade, afirma faltar-lhe coragem: “Eu não tenho ideia de quando vou voltar. Por isso não vou falar em prazo”.

De todo modo, esses fatos, a partir de agora, já fazem parte de um todo maior, que envolve Candelária e a 5ª Região Tradicionalista. Trata-se de uma história que não teve fim, mas que terá continuidade no imaginário das pessoas, além de persistir no coração e nas lembranças de Dona Elza.