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Geral 29/11/2018 19:12
Por: Redação

O desafio de transformar uma escola

Como a mudança de perfil provocada por uma diretora muda os rumos de um educandário

  • Danieta (no centro) com professores: “nosso aluno tem orgulho da escola”
  • A preocupação com os detalhes no esforço de embelezamento
  • Escola ganhou reformas e melhorias nos últimos anos
  • A quadra coberta da Escola Municipal Christiano Affonso Graeff

Muitas realidades duras da vida são consideradas imutáveis. Muitas vezes assistimos filmes na televisão dando conta de mudanças de comportamentos de algumas comunidades, especialmente escolas, taxadas como problemáticas, com alunos indisciplinados, bagunceiros e até mesmo marginais, que se transformam com a chegada de um novo diretor com uma nova proposta. Parece coisa de cinema, mas a vida imita a arte, e essa imensa mudança acontece na vida real. Exemplo disso é a Escola Municipal de Ensino Christiano Affonso Graeff, que tem origem em 1960, com o nome de  Dom Bosco, criada no loteamento que se desenvolveu a partir de 1959, e que depois passoua ser chamada Vila Ewaldo Prass, hoje Bairro Ewaldo Prass.
Criada oferecendo ensino até o quarto ano primário, tratava-se de uma pequena escola que foi legitimada em 1962. Não existe um dia propriamente dito para se comemorar seu aniversário, mas  a escola foi surgindo e foi crescendo, e, através de diversas regulamentações, chegando ao ano de 1977 tornando-se a Escola de 1º Grau Incompleto Christiano  Affonso Graeff, em decreto do dia 4 de novembro de 1977, e após, foi autorizada através de portaria, a ser uma Escola de Primeiro Grau Completo.
Porém, a pequena história contada no começo dessa matéria começou em 1º de janeiro de 2008, quando uma professora exemplar, oriunda das escolas municipais e particulares, foi convidada para assumir nessa data a direção da Escola Christiano Graeff. A comunidade mal sabia que dali para frente, com o convite aceito pela professora Danieta Heinen, a escola passaria por profundas transformações, até chegar aos dias de hoje com uma das melhores escolas do município de Candelária.
É importante ressaltar que Danieta trouxe consigo uma vasta bagagem de ensino, tida nas escolas por onde passou como disciplinadora e de grande capacidade de ensino, tendo realizado grandes trabalhos nestas escolas por onde passou. Em 2007, deixou de trabalhar em escolas particulares para assumir uma escola na Picada Escura, que, segundo ela, “serviu de base para esse trabalho na Christiano Graeff”.  A escola em questão era na época tida como “Escolinha da Vila”, de forma muito depreciativa, com problemas disciplinares profundos, mas especialmente com baixa autoestima de alunos, pais de alunos e comunidade em geral. Tudo isso era de conhecimento de Danieta, que, mesmo assim, aceitou o enorme desafio. 

“Se regras existem, é para serem cumpridas”
Danieta lembra que na sua chegada o desafio foi “impor regras, pois se elas existem são para ser cumpridas, e a partir daí, buscamos o apoio das famílias, reunindo um grupo de pais que trabalhava junto, foi ativado o CPM (Círculo de Pais e Mestres), com pessoas do bairro que, conforme percebemos, trabalhavam pela comunidade”. Ela fala com convicção que esse passo fez toda a diferença, porque, a partir desses pais, que trabalhavam junto com a direção da escola, outros pais começaram a perceber as diferenças que começaram a surgir no sistema de educação e especialmente no sistema disciplinar da escola”, explica a diretora. Além das mudanças na escola, houve orientações para que o aluno estudasse em casa. E, especialmente, foi criada uma consciência de que a escola é da comunidade, e sendo da comunidade, ela deveria cuidar. Como diz Danieta, “a escola não é minha, um dia vou embora, mas a comunidade vai continuar a viver aqui, seus filhos vão crescer aqui, e vão aprender e conquistar um futuro melhor” definiu.
A partir dessa conscientização, foi implantada uma nova mentalidade de que a escola deveria ser cuidada, através do projeto “Quem gosta cuida e colabora” a comunidade foi incentivada a ter esses cuidados, porque pertence a ela, o que  fez os pais interagirem com a mentalidade de escola/família. Para Danieta, esse foi o grande aprendizado que a comunidade teve, e daí por diante conseguimos realizar obras, para deixar a escola mais bonita, e até mesmo os roubos que eram frequentes acabaram.
É claro que, para conseguir tal sucesso, Danieta contou com uma equipe coesa, trabalhadora , “que pegou junto”, como ela diz, e explica que “os primeiros três anos foram os mais difíceis, quando professores e a equipe diretiva tiveram ação firme, quando havia grande resistência de pais e alunos, sendo que na época alguns alunos achavam que poderiam fazer o que bem entendiam, e os pais não aceitavam disciplinar seus filhos”. 
Danieta ainda lembra que “a partir do momento em que a comunidade entendeu que a escola existe  para melhorar a vida das pessoas e valorizar a autoestima, a mentalidade da “Escolinha da vila” mudou, chegando hoje a ser anunciada pelos alunos com notável orgulho dizendo: Estudo na Escola Christiano Graeff, no Bairro Ewaldo Prass, e tanto alunos quanto pais de alunos valorizam muito e têm orgulho de pertencer a esta comunidade. A escola atende alunos do Bairro Princesa, Ewaldo Prass e outros, e é a maior escola municipal, com aproximadamente 500 alunos até o nono ano, totalizando hoje 27 turmas.

“Ninguém é tão bom quanto todos nós juntos”
Danieta lembra que “com essas melhorias e a  nova mentalidade, fomos muito criticados, nos acusaram de fazer uma prisão, já que aumentamos os muros e ampliamos os espaços, e hoje não temos problemas em sair com qualquer turma e achar que nosso alunos irão criar problemas, já que nosso aluno hoje é disciplinado, trata com respeito as outras pessoas, mas exigem também ser respeitados. Nosso aluno hoje tem orgulho da escola, e é claro que hoje existem problemas de disciplina, mas nada diferente do que acontece em qualquer outra escola”, explica.
Os espaços foram ampliados e redistribuídos, com verbas dos governos estadual, federal e municipal, que hoje estão mais limitadas, mas todas as verbas recebidas foram investidas em melhorias para a escola, remanejamentos e restaurações de salas de aula e pinturas. Danieta conta que tiveram muito auxílio da prefeitura para fazer muros, para pintar. Além disso, a escola também dispôs de  de verbas arrecadadas com as festas juninas, e já são 11 anos de festas com o lucro revertido para a escola de forma democrática, já que a destinação dessa verba é decidida com o Conselho de Pais e Mestres (CPM), sendo o material adquirido com esta verba, e a Prefeitura se encarrega da mão de obra. Um bom exemplo disso são os aparelhos de ar-condicionado das salas de aula, e todas as salas possuem ar-condicionado - e  foram adquiridos com verbas dessas festas juninas.
Neste ano,  por exemplo, a verba da festa junina será destinada a arrumar os rebocos, já que a umidade acabou por estragá-los, revestindo as paredes com lajotas, e neste ano o CPM vai pagar o material e a mão de obra. “Nenhuma obra é feita sem que o CPM seja consultado, até porque é uma maneira de incluí-los nesta comunidade. Tanto que nas nossas festas nunca contratamos segurança, os próprios pais fazem a segurança, e nesses onze anos jamais tivemos uma briga na escola”, explica Danieta.
Indagada pela reportagem sobre quando pensa em parar, Danieta afirma que não sabe, mas pelo brilho do olhar quando fala da escola, deve estar longe esse dia. Ao menos é a torcida de pais, alunos e professores, que viram diante de seus olhos uma das piores escolas municipais se transformar e se tornar, junto com as outras escolas do município, uma escola exemplar. Com a frase “Ninguém é tão bom quanto todos nós juntos”, proferida pela diretora, tomamos conhecimento da dimensão do envolvimento da equipe docente com a comunidade.
(Por Erni Bender)