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Crônica 24/12/2021 14:07
Por: Redação

Crônica: é tempo de renovar a esperança

Quando os estabelecimentos fecharam naquele mês de março de 2020, sabia-se que a ordem era ficar em casa. Ninguém imaginava, porém, por quanto tempo. Duas semanas? Um mês? E poucos poderiam prever os acontecimentos que se sucederiam. Teve início então uma contagem de dias, que rapidamente se converteram em semanas, que, por sua vez, se tornaram meses. Teve início também outra contagem, essa difícil de descrever, de caráter mais trágico, que dava o tom do momento que o mundo vivia: a dolorosa enumeração dos mortos e das famílias que, mesmo sem tempo e informações para assimilar direito o que acontecia, ficaram enlutadas em razão do vírus. Mesmo que um dia tudo passasse, para os enlutados nada mais seria como antes. Nas ruas, o uso das máscaras, necessário para diminuir o contágio, criava um cenário quase pós-apocalíptico. Poucos sabiam que anteriormente, em 1918 e 1919, a epidemia da gripe espanhola havia sido responsável por abreviar um total de 50 milhões de vidas. Fato que, por sua vez, não era suficiente para aliviar em nada o caos que se viveu – e ainda se vive - nesses anos de 2020 e 2021.

Veio o inverno. Indiferentes às dores humanas, as estrelas, que tantas vezes trouxeram a quem as contemplava a impressão de ser uma partícula ínfima de um todo incompreensível, em momento algum deixaram de luzir, para quem quisesse ou tivesse condições psicológicas para vislumbrá-las. Com a primavera, a natureza não deixou de florescer, e poucas vezes as flores foram cercadas de tanta indiferença. Eram poucos, de fato, os que conseguiam, durante aqueles dias, voltar os olhos para elas. Então veio o Natal, trazendo consigo a repetição de um refrão tanto inédito como verdadeiro: foi o Natal em que a maior prova de amor era permanecer longe das pessoas amadas. Durante todos esses meses, era como se um prolongado mês de agosto tratasse de provar a uma humanidade perplexa que, em muitos casos, a única resposta possível era não só a ausência de respostas, como também a implacável enumeração de outras interrogações. E, para essa inexistência de explicações, a única solução era o mais antigo dos remédios: a esperança de dias melhores. Porém, dessa vez, esta também vinha acompanhada da necessidade de uma série de cuidados e protocolos rígidos, para que pudesse de fato ser chamada de esperança – no caso, uma esperança operante, essa que não vive apenas da espera, mas de uma atitude positiva frente à adversidade.

Entre seus mais diversos significados, Natal sempre foi sinônimo justamente de esperança. No ano passado, na capa de sua edição de Natal, a Folha de Candelária quis ressaltar esse aspecto, dirigindo-se a seus leitores nos seguintes termos: “Natal da pandemia: tempo de celebrar a esperança”. Um ano se passou, e, muito embora ainda não se possa dizer que a pandemia tenha passado, com os mesmos protocolos de segurança sendo exigidos em grande parte dos lugares, uma expressiva parcela da população mundial já se encontra vacinada, com o número de doentes diminuindo. No entanto, não é possível fazer de conta que nada aconteceu: antes pelo contrário. Em outras palavras, não é possível viver esse Natal sem lembrar de cada uma das mais de seiscentas mil vidas perdidas ao longo dessa pandemia, e lamentá-las juntamente com seus familiares. O preço para chegar até aqui foi alto, e ainda não terminou de ser saldado. Lembremos, pois, com respeito e reverência, dos que não estão mais aqui.

Por outro lado, tem-se a impressão de que, neste Natal de 2021, ressalvadas as vidas perdidas, já é possível ter um vislumbre de uma realidade um pouco mais próxima daquilo que antes de tudo se chamava normalidade. Um Natal feito de encontros, de abraços e sorrisos sem uma máscara a toldar as palavras. Ou, dito de outro modo, um Natal de recomeço. Mesmo que não seja mais possível retomar as coisas do ponto onde se parou antes de tudo, pode-se fazer o que está ao alcance das mãos. Pode-se começar com algo bem simples, na verdade. Enfeitando um pinheirinho, por exemplo. Lembro de haver escrito, certa vez, sobre o quanto existe de simbólico, e também de definitivo, no ato de enfeitar uma árvore de Natal, coisa que está longe de ser um aspecto meramente decorativo. Armar um pinheiro de Natal e decorá-lo, em suas diversas camadas de significado, consiste em, a partir desse gesto, viver o sentido festivo da existência, com todos os seus matizes, sob um sol que ilumina diferentes despertares – o despertar de cada um, após o longo agosto que se viveu. E, sob esse cenário, reunir todo o poder de evocação para imaginar uma noite estrelada e lembrar, mesmo que de memória, a melodia mais linda. E, viver, assim, uma noite feliz e cheia de plenitude.

Um Natal repleto de luz para você!