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Opinião 23/11/2020 16:37
Por: Redação

Por Erni Bender : a farinha do José

Entre várias atrações e peculiaridades, Morretes é famosa também por sua culinária, com destaque para a farinha de mandioca, típica na região

Localizada ao pé da serra do mar, existe um pequena e peculiar cidade que visitava muito quando morava em Curitiba. Morretes tem hoje aproximadamente 18 mil habitantes, ainda é uma pequena cidade, a 65 km de Curitiba.

Uma dessas peculiaridades é o fato de que Morretes tem uma estação ferroviária, que recebe os trens de carga e de passeio que descem a Serra do Mar. Uma viagem fantástica e bela, uma estrada de ferro que iniciou sua construção em 1865, 155 anos de história portanto, e que foi projetada pelos irmãos Rebouças. Em um passeio que fiz nesta ferrovia, o guia turístico inclusive salientou que engenheiros europeus se negaram a realizar esse projeto dizendo ser impossível. Porém, os irmãos Rebouças, afrodescendentes, segundo o guia, realizaram a obra com maestria. Conta a lenda que o engenheiro chefe, um dos Rebouças, teria cometido suicídio após a conclusão do projeto, achando que os trilhos despencariam. Mesmo não sendo verdade, a estrada de ferro, apesar de linda, assusta, à medida que passa por diversos túneis, viadutos e penhascos de dar medo em alpinistas.

Outra grande peculiaridade de Morretes são as montanhas na cabeceira da cidade, a Serra do Mar, que garante rios de águas transparentes, aprazíveis no forte calor e que leva milhares de curitibanos às suas águas, seja em Morretes mesmo, ou na Serra da Graciosa, de Curitiba a Morretes, em estrada construída por Dom Pedro, sinuosa e linda, e que tem às margens diversas cachoeiras e locais para camping e dias de lazer.

Outro fato muito pitoresco de Morretes, e é ai que entra o seu José, é a culinária que tem no Barreado um prato típico. O prato consiste em um ou mais tipos de carne bovina, de segunda, que são cozidas em diversos temperos em panelas de barro, lacradas com farinha molhada e que ficam cozinhando por três dias, formando um caldo fabuloso e com a vantagem de poder ser requentada e manter o mesmo sabor. E especialmente comida com a farinha de mandioca, que também é típica da região.

Demorei, mas cheguei à questão do seu José. Ocorre que esta farinha é usada não só pelos, digamos nativos, mas pelos milhares de curitibanos que todos os finais de semana lotam os restaurantes da cidade, e é vendida nas barracas que ficam às margens das rodovias que dão acesso a cidade. O povo gosta mesmo, e nossa família era consumidora voraz de tal farinha. Meu irmão Jeferson, o Tinho, na época trabalhava em uma empresa de Morretes, e era bastante comum minha mãe pedir a ele que não esquecesse de trazer a farinha do seu José. E meu irmão não esquecia, trazia sempre um ou dois quilos da tal farinha.

Em uma ocasião meu irmão teve que ir a Morretes em um sábado, o que não era contumaz, e minha mãe o lembrou de trazer a farinha. O mano, pra não esquecer, passou já na ida, na barraca do seu José, para comprar a tal farinha. Claro que de tanto ir ao local, meu irmão já era da casa, amigo do seu José, e chegou lá de manhã ainda, e não vendo o seu José indagou de seu paradeiro. Ele, muito conhecido da família, foi orientado a ir para a parte dos fundos da propriedade, onde lá encontraria o amigo. É preciso descrever o seu José, um homem gordo, com pelos de causar inveja ao Tony Ramos. Chegando à parte dos fundos da propriedade, lá estava o seu José, suando a cântaros, com um pedaço de mandioca na mão ralando em uma pedra para fabricar a farinha, misturada a muito suor. Nunca mais compramos farinha do seu José....