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Geral 24/03/2017 09:21
Por: Luciano Mallmann

A multiplicidade de vozes como formadora de opinião

Quatro colunistas passam a escrever para o novo site

  • Arthur L. Mallmann: questões morais e éticas
  • Marcos Rolim: sociologia e política
  • Ângelo Savi: um olhar cosmopolita

Aqueles que buscam inteirar-se a respeito do ato de escrever deparam-se, volta e meia, com afirmações que, à força de repetir-se, acabam formando, a respeito do tema, um acervo de ideias recorrentes e não raro possuidoras de aspectos folclóricos em torno da escrita. Como exemplo, pode-se citar o quanto é comum ouvir, por parte de escritores e redatores, a respeito do caráter solitário da escrita. Não se trata aqui de desmentir verdades estabelecidas e aceitas como tal - até porque chega um momento em que esse recolhimento é, de fato, necessário, porém consiste num estágio final. O que se busca dizer aqui é que, com essa ênfase no aspecto solitário do escrever, corre-se o risco de ser ingrato com todo um contexto que antecedeu o momento da formulação das ideias que constarão de um artigo, uma crônica ou mesmo de uma obra literária. Corre-se o risco de não reconhecer o grau de legitimidade de tudo que formou a mente e o pensamento da pessoa que escreve. Em tal contexto, encontram-se educadores, amigos, escritores e filósofos, entre tantas áreas do conhecimento. Acrescente-se a isso o tempo necessário à leitura de muitos autores e as vivências particulares a cada ser humano, que lhe moldam o olhar. As opiniões veiculadas nos textos costumam ter sua origem na multiplicidade de vozes que deram origem ao nosso modo de ver e de pensar. E é essa mesma multiplicidade que permite observar um fato através dos mais diversos ângulos, que deveria ser o único modo válido de ter um vislumbre de suas nuances. Isso para apenas aproximar-se da realidade, não para atingi-la. Pois, como escreveu Luiz Felipe Pondé, "a verdade é uma nuance entre mil erros".

Em março de 1986, o criador da Folha de Candelária, o jornalista Marco Antônio Mallmann, estampava na primeira edição um editorial intitulado "Opinar é preciso", em que convidava a população a manifestar-se por escrito naquele espaço recém-inaugurado. Na época, quase tudo convidava ao entusiasmo, principalmente na visão de um jovem jornalista a poucos meses de sua formatura. Pois, com o fim da ditadura, vozes até então emudecidas recobraram seus brados e fizeram ouvir seus apelos por um Brasil mais justo. A comunidade, por sua vez, atendeu a esse chamado. Pessoas que nunca antes haviam se manifestado publicamente souberam encontrar ousadia para escrever artigos sobre os mais diversos temas. E Candelária, nas páginas da Folha, se reconheceu como uma comunidade feita por aquilo a que aludimos acima: uma multiplicidade de vozes.

Passados 31 anos depois desse primeiro editorial, a Folha de Candelária apresenta aos seus leitores um site reestruturado, com um lay out mais moderno, no qual os candelarienses poderão encontrar novidades no que se refere ao conteúdo. Pois, além das notícias que são destaque já no site atual, haverá um espaço dedicado a colunistas, cronistas que, em princípio, serão limitados ao número de quatro. Entre eles, não por acaso, consta Arthur Lersch Mallmann, único filho do jornalista Marco Antônio Mallmann, falecido em dezembro de 1994.

Candelariense de nascimento, Arthur, aos 23 anos, é bacharel em Relações Internacionais, pela Universidade Federal de Santa Maria. Atualmente é acadêmico de Filosofia, na mesma instituição. Os textos de Arthur irão versar sobre política e filosofia no cotidiano. Para Arthur, o ser humano é uma espécie que se destacou, gradualmente, a transformar sua realidade imediata. Conforme ele ressalta, de coletores, caçadores e camponeses rudimentares, a humanidade passou a viver em sociedades de economia complexa, produzindo arte e cuja ciência já alcançou a robótica e a viagem espacial. Esse progresso técnico acontece, salvo grandes rupturas, como diziam os antigos, "devagar e sempre". Porém, não é nesse progresso que Arthur pretende se deter, mas sim, conforme suas próprias palavras, em "questões que permanecem as mesmas desde que o homo é sapiens e se reiniciam a cada nova geração": na sua percepção, são estas as nossas questões morais e éticas. Entre elas, consta o que Arthur chama de quase incapacidade do ser humano de sentir empatia por pessoas identificadas pelo rótulo de "diferentes". Ajudar a diminuir a dificuldade da transposição desses muros socioculturais está entre os sonhos desse jovem candelariense.

Outro colunista será o advogado Ângelo Savi, formado em Direito pela Unisc, instituição onde também cursou pós-graduação em Direito Processual. Uma das habilidades de Ângelo, além de escrever, é conseguir manter o ar de cosmopolitismo mesmo numa cidade pequena, em tantos aspectos provinciana, como Candelária. O alto grau de sua miopia o impediu, quando criança, de se dedicar a atividades a seu ver então mais atraentes, como jogar futebol, entre tantas outras. Por essa razão, desenvolveu o hábito da leitura, tornando-se, desde cedo, um leitor voraz. Conforme costuma dizer, interessa-se por "quase tudo", e sob essa designação constam temas como História, política, filosofia, literatura, probabilidade, estatística e, mais recentemente, a Economia.

Já Marcos Rolim é jornalista, sociólogo e político, atuando também como professor universitário e consultor em segurança pública e Direitos Humanos. Formado em Jornalismo pela Universidade Federal de Santa Maria, cursou mestrado e doutorado em Sociologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul. É professor de Direitos Humanos do Centro Universitário Metodista. Atualmente, é coordenador de Comunicação Social do Tribunal de Contas do Estado do Rio Grande do Sul e membro do Conselho Nacional de Política Criminal.

Fechando o quadro de colunistas, está o bacharel em Relações Internacionais e acadêmico de História da Universidade Federal de Santa Maria Wagner Azevedo. Passo-fundense, 24 anos, Wagner é coordenador regional e arquidiocesano da Pastoral da Juventude. Percebe-se em Wagner a intensidade com que defende os assuntos de sua predileção. Foca sua vida na transformação de estruturas a partir das bases sociais, interligadas no dia a dia, na família, na universidade, na Igreja e nas redes sociais. Nas suas palavras, "é um grande dever da humanidade reconhecer no outro a divindade, da mesma forma como perceber que o Cristo volta à terra junto aos irmãos marginalizados diariamente para salvar da opressão". É sua intenção denunciar, em seus artigos, "todas as formas de opressão às minorias sustentadas por estruturas que reproduzem o ódio e a descrença em Deus".

Esses quatro colunistas, mesmo sendo fortemente comprometidos com a realidade que os cerca e possuindo uma relevante formação teórica acerca dos temas sobre o quais irão discorrer, deverão formar um painel em que poderá haver opiniões contrastantes, até mesmo opostas, sobre os mesmos assuntos. É esse, entretanto, o efeito que a Folha busca, ao oferecer mais de um ponto de vista. É importante lembrar que, como foi dito, uma visão mais precisa se forma depois que se teve acesso a uma pluralidade de ângulos. Sem esquecer que nosso mundo é, antes de tudo, uma invenção plural.

Em entrevista recente, o escritor português Valter Hugo Mãe fala da importância de se ter a coragem de dialogar. Trata-se de expor uma opinião e, em seguida, ouvir o que o outro tem a dizer sobre o assunto. Pode haver uma espécie de desestruturação nessa experiência, necessária, porém, para o processo de crescimento. Ver uma ideia que se tinha como verdade absoluta ser desconstruída em poucos minutos exige a humildade de reconhecer que se estava errado. Mas, através dessa atitude, revela-se também a sabedoria de reconhecer no interlocutor o porta-voz de uma verdade. De acordo com o escritor, não podemos contar com a pessoa que não diz o que pensa: "É como uma demissão da cidadania. Quem não assume o que pensa, quem não dialoga, não é um cidadão. É apenas um consumidor". É isso o que a Folha, hoje, propõe aos seus leitores: que não percam a coragem de expor seus pontos de vista, de defendê-los, se for necessário, ou ainda, caso haja essa coragem, de reconhecer a razão na voz do outro.