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Geral 27/04/2018 15:03
Por: Tiago Mairo Garcia

Moradores da Várzea do Botucaraí querem permanecer em Candelária

Presidente da Associação de Moradores alega que empresa situada na localidade estaria pressionando para mudar denominação da área para Cachoeira do Sul

  • Carlos Gomes da Rosa mostra a divisa entre Candelária e Cachoeira do Sul no acesso até a Ponte de Pedra, na Várzea do Botucaraí
  • Secretário de Planejamento, Lucas Michels:
  •  Ivan Moura (centro) e seus familiares confirmam que a Várzea do Botucaraí pertence à Candelária
  • Escola Municipal Valentin Pinto Porto, que está desativada, pertence a Candelária
  • Antonio e Onilia Ortiz
  • Moradores relatam que área onde está a empresa Paralelo 30 pertence a Candelária. Empresa confirma que área pertence para Cachoeira do Sul

Um amplo debate que deverá ter vários capítulos. É o que se vislumbra na disputa da localidade de Várzea do Botucaraí, situada na divisa entre os municípios de Candelária e Cachoeira do Sul. De um lado estão os moradores, que possuem blocos de produtores registrados em Candelária e querem que a localidade permaneça para o município. Do outro está a empresa Paralelo 30, especializada na produção de noz Pecã, que mudou o seu registro de Candelária para Cachoeira do Sul, conforme os mapas do IBGE sobre a divisa na região e que, segundo os moradores, vem fazendo pressão para que toda a localidade pertença em definitivo ao município vizinho.

Na manhã da última terça, 24, a reportagem da Folha foi até a localidade, situada a aproximadamente 50 km da sede de Candelária. O presidente da Associação dos Moradores do Capão do Valo, Carlos Gomes da Rosa, explica que pelos mapas do IBGE a divisa aponta para o Arroio Tibiri, quando na verdade a divisa entre os municípios ocorre pela ERS 403 e segue pela antiga estrada Cachoeira do Sul/Rio Pardo, que passa pela localidade até o local conhecido como Ponte da Pedra, onde está situada a divisa entre os dois municípios.

Ao ingressar na estrada antiga que dá acesso à Várzea do Botucaraí, logo se chega à empresa Paralelo 30. Rosa explica que a área da empresa está dentro do território que pertence a Candelária. Ele cita como exemplo o cemitério dos Ortiz, localizado dentro da área da empresa, onde está sepultado Oscar Corrêa Ortiz, antigo proprietário da área, para destacar que a empresa está no lado pertencente a Candelária. "Toda essa área da empresa pertencia ao meu falecido tio e a Candelária", frisou ele. Ao lado da área da empresa também está localizada a antiga escola municipal Valentin Pinto Porto, que atualmente está desativada. 

Após andar aproximadamente 9km pela estrada, o presidente mostrou a divisa entre os dois municípios no local conhecido como Ponte de Pedra. Ouvidos pela Folha, os moradores Antônio Alci de Moraes Ortiz, 78 anos, e Onila de Oliveira Ortiz, 74, confirmam que a divisa entre os municípios sempre foi pela estrada antiga até a ponte da pedra. Eles não concordam com a mudança da localidade para Cachoeira do Sul e frisaram que querem permanecer em Candelária. "Sempre tivemos nossos blocos registrados em Candelária, somos de Candelária e queremos continuar pertencendo ao município", frisaram .

Por sua vez, o agricultor Ivan Bello Moura, 33 anos, que estava acompanhado da esposa, Aline de Oliveira Dias Moura, do irmão Elvis Bello Moura e do pai, Ivo Loreto Moura, também confirmou que a área da localidade pertence a Candelária. "Nós sempre fomos de Candelária, mas o prefeito de Cachoeira quer imposto e voto. Já fizemos um abaixo-assinado para manter como está", disse Moura. O agricultor confirmou ter enfrentado problemas com financiamentos. "O banco olha a escritura da terra, que é de Candelária, e ao olhar no mapa as coordenadas vê que pertence a Cachoeira, trancando o financiamento", salientou. Ele disse ainda que a localidade possui uma área de aproximadamente 2,8 mil hectares de terra que possui como principais fontes de economia a agropecuária e o cultivo de soja e arroz. Moura frisou que até o momento ninguém do IBGE ou da Secretaria Estadual de Planejamento esteve na localidade para avaliar a demarcação da divisa. 

O presidente da Associação acredita que, internamente, a empresa Paralelo 30 está fazendo pressão para que a localidade passe a pertencer a Cachoeira do Sul. "Os donos são de lá e tem muita proximidade com o prefeito de Cachoeira. É uma empresa organizada e que vem crescendo. Seu único erro é dizer que é de Cachoeira, porque aqui onde ela está é Candelária", finalizou Rosa.

 

Paralelo 30 confirma que área da empresa pertence a Cachoeira do Sul

Ouvido pela reportagem da Folha, o gerente da empresa Paralelo 30, Clóvis Fernando Schütz, confirmou que a empresa mudou o seu registro de Candelária para Cachoeira do Sul após mapas do IBGE apontarem que a divisa entre os municípios está localizada no Arroio Tibiriça. "Pelos mapas do IBGE a nossa área, de aproximadamente 180 hectares, pertence a Cachoeira do Sul. O gerente também destacou que a mudança ocorreu devido à proximidade geográfica da empresa com município vizinho. "Os proprietários são de Cachoeira do Sul e para nós facilita a logística, pois são apenas 12km de distância com a sede do município", finalizou o gerente.

 

Lucas Michels: "Não vamos medir esforços para manter a área em Candelária"

Questionado pela reportagem da Folha sobre o assunto, o Secretário Municipal de Planejamento de Candelária, Lucas Michels, informou que ao município sempre teve a localidade como pertencente a Candelária. Ele explica que um decreto estadual de 1944 sobre a delimitação da área feita pelo Governo do Estado tem gerado a confusão nos mapas. "O decreto fala que a divisa vai até o Arroio Tibiri, mas esse arroio é inexistente. Os moradores  da localidade têm seus blocos registrados aqui, votam em Candelária e sempre se declararam de Candelária. Não vamos medir esforços para manter a área em nosso município", disse Michels. O secretario também confirmou a troca de endereço da empresa Paralelo 30 para Cachoeira do Sul e destacou que o município está aguardando o abaixo-assinado feito pelos moradores da região para encaminhar ofício à Secretaria Estadual de Planejamento para que uma equipe venha até a região para analisar a demarcação das divisas.

 

O que dizem as autoridades de Candelária e Cachoeira do Sul
O assunto veio à tona após o vereador Daniel Bernardy relatar o problema dos moradores da região em sessão ordinária na Câmara de Vereadores no mês de fevereiro. No dia 1º de março, o vereador acompanhou uma comitiva de moradores em reunião com o prefeito em exercício, Nestor Ellwanger, e o Secretario Municipal de Planejamento, Lucas Michels, na qual ficou acertada uma audiência com a Secretaria Estadual de Planejamento para buscar uma solução para o problema. No encontro, realizado no dia 14 de março, na sede do Deplan, em Porto Alegre, a comitiva candelariense, formada pelo prefeito Paulo Butzge e demais lideranças locais, relataram o problema para Laurie Cunha, analista de Planejamento, Orçamento e Gestão, do Departamento de Planejamento Governamental, da Secretaria Estadual de Planejamento, Governança e Gestão. Após ouvir os relatos, a profissional orientou o prefeito candelariense a formalizar um ofício para o diretor de Planejamento, Antônio Paulo Cargnin, anexando cópias de escrituras de moradores registrados em Candelária e um documento com a assinatura dos moradores prejudicados com este impasse e que não concordam com o domínio sobreposto pelo IBGE. Com base nestas informações, a Secretaria Estadual de Planejamento irá enviar uma equipe para realizar uma avaliação da divisa para efetuar a correção dos dados no sistema.
Em reportagem publicada no dia 06 de abril pelo Jornal do Povo, de Cachoeira do Sul, o município de Cachoeira do Sul passou a agir para manter a área conforme os mapas do IBGE. Em entrevista concedida ao jornal, o Prefeito de Cachoeira do Sul, Sérgio Ghignatti, diz que confia nos mapas do IBGE, feitos por imagens de satélite e pretende fazer com que os impostos sejam descontados em Cachoeira do Sul, pois, segundo ele, toda a localidade de Capão do Valo pertenceria a Cachoeira do Sul. O procurador jurídico de Cachoeira do Sul, Leonel Gonçalves, afirma que o primeiro passo é conferir a divisa entre os dois municípios pela legislação estadual e, se for o caso, exigir a correção das escrituras no registro de imóvel, bem como retificar os registros nos talões de produtor e outros documentos, para que os impostos passem a ser recolhidos por Cachoeira do Sul.
O coordenador do censo do IBGE, Diogo Cesar Fortes, explica que o órgão apenas auxilia na identificação de áreas, mas quem tem o poder legal de revisar a divisa entre os municípios é o Governo do Estado. Os limites entre as duas cidades estão definidos em três referências: o rio Botucaraí, Arroio Tibiri e a ERS 403. No total, a região da Várzea do Botucaraí possui 22 famílias, que, juntas, detêm 2,8 mil hectares de terra. As principais atividades são o cultivo de soja, arroz e o ramo agropecuário, sendo uma das regiões mais produtivas.