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Colunista 31/03/2017 13:52
Por: Ângelo Savi

Por que o Brasil é corrupto

 

As patifarias da república, as quais ficamos sabendo diariamente, já não deixam o país alarmado justamente porque passaram a fazer parte do cotidiano. Ultimamente foi a Carne Fraca o Leite Compensado, os conselheiros do Tribunal de Contas do Rio de Janeiro, o Badesul (este nem é muito falado, mereceu apenas algumas notícias nas páginas internas dos jornais porque se trata de contratos irregulares cujo montante do desvio é de pouco mais de cem milhões) e o que mais? São tantos que confundem e impedem a memorização. Até o Petrolão começa a ser esquecido.

Na década de oitenta do século passado havia um anseio pela redemocratização. A impressão que se tinha era a de que, com a democracia, todos os problemas se resolveriam. Mas piorou, porque democracia não é apenas votar de tempos em tempos, que é no que se resume a nossa, e a Constituição de 88 atribuiu ao estado o poder divino de transformar o Brasil num paraíso. Já na arrancada, o primeiro presidente eleito em mais de vinte anos foi defenestrado pelo impeachment. E de lá para cá vivemos numa crise permanente e gloriosamente ascendente até chegar ao extremo atual, que está nos pondo à beira da ruptura ou da implosão. É que, desde que o país se redemocratizou, o estado foi inchando a ponto de hoje consumir quarenta por cento de tudo que se produz por meio da extorsão dos impostos. Na verdade, é muito mais se somarmos o endividamento. A dívida do país é de quatro e meio trilhões, e o déficit atual é de mais de quinhentos milhões, que são pagos através de mais endividamento. Esta é a principal razão pela qual os juros no Brasil são os mais altos do mundo: é óbvio que quem empresta dinheiro sempre irá preferir emprestar para o governo cujo pagamento é certo (será?). Não sobra dinheiro para emprestar para as pessoas e as empresas e, se sobrar, só a preços altíssimos. E mais. Todo o dinheiro que é consumido em empréstimos para o governo não será emprestado aos particulares, isto é, será desperdiçado nos inúteis gastos públicos, não será usado na construção, fabricação, prestação de serviços, enfim, em tudo aquilo que se chama de produção, e que é o que realmente traz prosperidade. O caso é de um parasita que está na iminência de matar o hospedeiro. Para piorar, o grosso da população é enganada com bolsa-isto, bolsa-aquilo, com aposentadorias miseráveis, com a piada do SUS, não se apercebendo que o que lhe tiram é muito maior do que os caraminguás que lhe dão.

O que isto tem a ver com a corrupção? Tudo. Como o governo dispõe de uma montanha de dinheiro, é natural que seja assediado por assaltantes. Aliás, são os assaltantes os pais da criança, foram eles que construíram a aberração fazendo leis insanas e administrando como asnos. É como acontece com os bancos. Dá uma mão de obra ingrata assaltá-los. O ladrão pode ser preso, levar um tiro, é necessário driblar câmaras de segurança, portas giratórias, seguranças armados e sabe-se lá o que mais, mas mesmo assim os bandidos se empenham em assaltá-los, precisamente porque é lá que tem dinheiro. Sendo o homem o que é, não há como se evitar que os mal-intencionados façam o mesmo com o governo. Só que é ainda pior. No governo, além de dinheiro, há o poder. Poder é ainda mais sedutor do que dinheiro e tendo o país adotado um regime socialista de fato, em que tudo é regulado e o governo tem a pretensão de resolver também tudo, é mais do que evidente a enorme atração que esta circunstância exerce sobre psicopatas variados, sôfregos em mandar. Democracia é exatamente o contrário do que se pratica no Brasil. Democracia como foi pensada modernamente é um arranjo político em que o poder do estado é reduzido e limitado. Materializou-se na independência dos Estados Unidos, em que os fundadores – os Pais da Pátria, como eles dizem – pensaram um sistema em que o estado NÃO se meteria na vida do cidadão a não ser em áreas muito restritas, como justiça e defesa. Basta ver que até meados do século 19 eles mantinham uma política externa de neutralidade e não-intervenção. Depois da Guerra de Secessão a coisa mudou e hoje eles metem o bedelho no mundo inteiro, contrariamente ao espírito que animou a sua fundação.

Portanto, o remédio para a corrupção é menos estado, não mais. Frequentemente se veem autoridades e pseudoespecialistas dizendo com orgulho que o que importa é que as instituições estão funcionando, em alusão à Lava-Jato. É exatamente o contrário: a Lava-Jato nos prova diariamente que não há nada funcionando no Brasil, salvo ela própria, que, por ser exceção, confirma a regra, um ponto fora da curva, como dizem os estatísticos. Quando tudo, literalmente tudo, está em adiantado estado de decrepitude, a única conclusão válida é que não deu certo. E vai continuar a não dar certo se o estado continuar do jeito que está. Depois que passar a fase atual de caça à corrupção, é provável que as coisas se acalmem um pouco, que os corrompidos sosseguem durante um tempo, mas depois a roda da bandalha vai recomeçar a girar, porque tem que ser assim. Porque, se o estado continuar tendo o tamanho que tem, fatalmente continuará a atrair e a ser controlado pelas moscas de sempre.