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25/08/2009 16:56
Por:

Invas?o de privacidade

“Alô, Senhor Percíval? Tudo bem com o senhor?”. Estava, minha filha. Estava tudo bem comigo até você decidir que já era hora de pôr fim nisso com mais um maldito telefonema cujo único objetivo é o de tentar me vender algo por telefone.
O sujeito que inventou o telemarketing está credenciado ao título de inimigo público número um do terceiro milênio. Bem mais de cem milhões de telefones fixos e celulares existentes no país passaram a ser usados, cotidianamente, como forma de contatar clientes, o que mostra o vulto que esse tipo de negócio assumiu. São bilhões de ligações comerciais promovidas todo mês. “Alô! Queria falar com o titular da linha. Meu nome é Adriana, e o seu?”. Ora, me poupe! Ou então: “Alô, senhor Perceval! (Meu nome deve ser um problema sério para essas moças) Quero informar que, para sua segurança, esta ligação está sendo gravada, mas preciso confirmar alguns dados pessoais”. Minha segurança? Meus dados? Por telefone?
Bem, deixa para lá, todo mundo sabe do que estou falando porque todos recebem esse tipo de chamada. São operadoras de telefonia, bancos, cartões de crédito, corretores, ONGs fazendo pesquisas sobre aquecimento global (e ligam para mim!). Se o freguês trocou de carro ou fez uma viagem ao exterior, pode esperar para os próximos dias uma enxurrada de ligações propondo encantadoras despesas ou suplicando indispensáveis informações sobre seu perfil de consumo.
O telefone tem esse caráter imperativo. Tocou, a gente atende. Se não atende ele fica chamando, insistente e irritantemente, até que se lhe dê atenção. Está associado à idéia de urgência. Está ali para a necessidade imediata. Trim-alô, é o binômio da comunicação moderna. Por isso, o telemarketing virou um suplício a perturbar o trabalho, a refeição, a happy hour e os momentos de intimidade conjugal e familiar. Já pensou? Você está nos “aquecimentos” e o celular toca: “Alô, senhor Pêrcival? Aqui é da empresa tal e eu queria informá-lo sobre nossas novas tabelas nas ligações para Myanmar e Paquistão”. Ninguém merece!
Estamos, portanto, diante de completa inversão no sentido dessa comunicação. O telefone é uma utilidade “do” e “para o” assinante, destinado às suas necessidades pessoais, e no círculo de suas relações e conveniências. Deveria ser proibido seu uso como instrumento de assédio por interesses que não tenha demandado. Propostas, lançamentos, formulários e questionários deveriam ser comunicados por via postal, que a gente abre se quiser. Jamais, em hipótese alguma, através do telefone. Será tão difícil fazer uma lei contra isso?

Percival Puggina, escritor
www.puggina.org