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Região 26/02/2021 12:16
Por: Diego Foppa

Enxurrada devastadora completará 18 anos

Tragédia ocorrida no dia 6 de março de 2003 provocou a morte de quatro pessoas da mesma família na localidade de Linha São João, em Novo Cabrais

  • Cenário desolador: foto após a enchente mostra casa da família  totalmente destruída; volume de chuva em 40 minutos foi de cerca de 300 milímetro
  • Pilares foram construídos no local em que estava a moradia e cada um representa uma das vítimas fatais da enxurrada
  • Odete ao lado do companheiro Délio: fé em Deus
  • Reportagem da Folha, veiculada em 11 de março de 2003, destacou a enchente como sendo a maior de todos os tempos no município

Um dia trágico. É a definição do dia 6 de março de 2003 para a cabraisense Odete Bueno Camargo da Silva, atualmente com 57 anos. Naquela fatídica quinta-feira abafada, Novo Cabrais foi atingido pela maior enxurrada de sua história, que deixou um saldo de destruição. No entanto, a enchente não trouxe apenas danos materiais. Na localidade de Linha São João, a mais atingida pelo volume de chuvas, Odete perdeu o marido Valderi da Silva, 35, e os filhos Valdete da Silva, 16, Vinicio da Silva, 13, e Valéria da Silva, 6. As quatro vítimas fatais estavam no interior da casa na qual viviam no momento em que a moradia foi destruída pela correnteza. O chalé de madeira ficava nas proximidades do Arroio Barriga e do campo do Esporte Clube São João. Quase 18 anos depois do ocorrido, as memórias permanecem vivas na mente de Odete, que afirma jamais esquecer os detalhes daquela tragédia. Com a voz embargada e emocionada, Odete conta tudo teve início por volta das 18h30, quando ela estava na casa de seu pai, localizada nas proximidades, mas no outro lado do arroio. “Era muita chuva. Algo jamais visto. Só se enxergava relâmpagos e muita água”, recorda. A moradora relembra ainda, que mesmo com o dilúvio, saiu da casa do pai, atravessou a ponte sobre o arroio, visando voltar para casa. “Fui caminhando pela encosta da valeta, pois a estrada parecia um rio. Quando me aproximei da minha casa, percebi que ela já havia sido totalmente destruída”, comenta. Era o início de um ‘pesadelo’, como ela define. “Entrei em desespero e me abriguei na casa da Beloni (vizinha das proximidades). Mas até então, eu acreditava que o Valderi e as crianças tinham saído da casa, quando iniciou o dilúvio”, acrescenta.  A tempestade teria durado cerca de 40 minutos, tempo suficiente para que fosse registrado um volume de aproximadamente 300 milímetros de chuva. Sem qualquer maneira de contato, Odete salienta que passou a noite acordada na vizinha. “Desespero total por não ter notícia de nenhum deles (familiares). Era muita água, barro e galhos espalhados por todo lado e não tinha energia elétrica para sairmos para procurar”, revela. No dia seguinte, o drama só aumentou, quando os corpos dos familiares de Odete foram encontrados nos arredores em meio aos destroços. "É algo que não tem como explicar. Tudo que construí em 18 anos foi levado em alguns segundos”, diz.

 

 Fé em Deus e ajuda da comunidade para reconstruir a vida

Diante da situação vivida por Odete, não há como negar que o sentimento de impotência e falta de esperança seria normal. “O tempo passava e a ficha não caia”, ressalta. Desde 2005, ela vive com o companheiro Délio Cerentini, ainda em Linha São João. “Tive muita fé em Deus e contei com a ajuda de várias pessoas da comunidade em geral para amenizar essa dor e reconstruir minha vida”, acrescenta Odete, que também sofre com algumas sequelas deixadas por um Acidente Vascular Cerebral (AVC) em 2014. “Ainda passa um filme na cabeça, mas tento me distrair cuidando da horta, jardim e alguns afazeres domésticos”, finaliza. 

 

PILARES - No local em que estava a casa, atualmente existe uma plantação de milho e mandioca. Porém, em uma parte do terreno é possível visualizar quatro pilares de diferentes tamanhos, que foram construídos por um irmão de Odete, e representam as vítimas da tragédia. 

 

RELEMBRE -  As águas que desceram das encostas trouxeram também lama e pedras, responsáveis pela devastação de estradas, lavouras, horas e pomares. Potreirinho, Linha Pfeiffer e São João foram as localidades mais atingidas. Na época, o então prefeito do município, Valério Lawall, decretou estado de calamidade pública A Comissão de Defesa Civil realizou um dossiê apontando perdas de R$ 958.450,00 em todos os setores da economia local. O documento também registrou 60 casas danificadas, quatro destruídas e 50 pessoas desabrigadas.  

Fotos: Diego Foppa e Arquivo Folha