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O melhor bolo que Papai Noel j? comeu
Tentativas frustradas
Tentei participar com um conto de Natal em todas as promoções de que se tem notícia por aí, pois pretendia ganhar algum prêmio, tipo um xéster (aquela galinha criada a Toddy) ou um litrão de espumante dos bem doces, porém, o que recebi foi somente xingões. Como derradeira e desesperada tentativa, mandei uma cópia para o Papai Noel, que mora ali na praça e, para minha surpresa, o bom-velhinho me telefonou e disse que o texto ficou uma bosta; seus duendes, que também analisaram o texto, disseram que nunca tinham visto nada tão sem cabimento. Antes de bater o telefone na minha cara, Noel adiantou que por causa disso este ano eu vou ficar sem meu presente preferido: os tradicionais carpins pretos com bolinhas da mesma cor que uso para dormir com meu cuecão verde musgo e uma camiseta branca com figuras abstratas cor da pele. Como eu não acredito muito naqueles duendes e não quero me “queimar” com o Papai Noel para o próximo ano, resolvi publicar aqui mesmo o texto, quem sabe uma alma caridosa me mande um xéster ou um peru ou mesmo aquele espumante doce. Antes que alguém seja pego de surpresa, quero adiantar que a história contém palavreado em alemão, por isso, se você não tem a mínima noção da língua alemã, arrume um tradutor e vá adiante. Lá vai!
O melhor bolo que Papai Noel já comeu
Era véspera de Natal, e aquela família tipicamente alemã, de sobrenome Alves, acordou cedo. O Nêni e a Nêna tinham ido dormir na casa do Fata e da Muta porque de manhã cedinho seus pais, o Radioldo e a Relmengarda iriam à cidade para fazer compras. Todos levantaram felizes naquele dia, porque à noite teria uma ceia natalina de Natal. A Muta preparou o café com pão de milho, cribaximia, ximia de melancia de porco e leite morno com café e melado para o Fata e para o Nêni, pois logo teriam que ir ao chiqueiro para carnear um chuáina do qual seria feito um assado no forno para ser comido à noite. Ao chegarem lá, notaram que o chuáina não estava no chiqueiro, tinha se soltado e tava comendo o resto dos baraços de batata-doce da horta, porque repolho e alface ele já tinha comido tudo. O Fata, meio entrevado, queria correr atrás do porco, mas tropeçou num toco de mandioca que interrompeu sua corrida, caindo de boca num esterco fresco que iria utilizar para adubar a horta. Num esforço descomunal e um tanto de contorcionismo ele conseguiu chupar o dedão inchado como forma de aliviar a dor, e ainda gritou para o Nêni: “Béga ésta leiton, curí”. O Nêni, no vigor da sua juventude, conseguiu pegar o porco pelas orelhas, aplicou um golpe de caratê chamado mika-guei-todo e imobilizou o bicho. Dali para o suíno virar criba foi questão de horas.
A Nêna sempre acordava mais tarde porque todas as noites ela saia para procurar ninho de cavalo na roça com o filho do vizinho. Eles nunca acharam o tal de ninho, sempre voltavam extremamente cansados e escabelados mas nunca deixaram de procurar, falando que era bom para a saúde. Mas naquele dia a Muta precisava muito da ajuda de Nêna, e despertou a mocinha mais cedo gentilmente, com um pouco de água gelada dentro da orelha e bradou: “Fai no calinhêro e pusca ôvo e xá tráis xunto uns craveto pra fazer fóia. Tispois tu toma gavé”, ordenou a vé... ops, a Muta. A moça resmungou alguma coisa parecida como “vai tomar iogurte”, mas foi. Na volta, com os chinelos de dedo puro cocô de galinha, recebeu outra ordem: “O Fáta nunca tira a ácua da caméla tespois de lavar aqueles casco dele, uma vez. Fai tu e tira aquela mixórna de lá que eu quero amassar um pôlo dentro”. A moça resmungou alguma coisa parecida com “mas que lerda”, mas foi.
Com tudo pronto, gamela limpa, ingredientes selecionados, a muta foi dar um jeito no forno para assar o bolo depois de batê-lo; mas como o Nêni era muito relaxado, da última vez que utilizou o forno para assar batata-doce acabou deixando a porta aberta, o que foi um convite para as galinhas fazerem ninhos lá dentro. Tinha três chocas com pintos e mais duas chocando e na hora que a Muta foi botar os gravetos no forno, uma das galinhas das mais brabas, daquelas polacas de pescoço pelado, deu uma bicada no dedo dela, que não pôde mais amassar o bolo. Ali foi quebrado o primeiro tabu desta história: o de que só peru morre na véspera.
Enquanto a Muta foi amarrar o dedo com um resto da ceroula velha do Fata, sobrou para a Nêna a tarefa de bater o bolo, mas como era muito preguiçosa, resolveu levar a gamela para bater o bolo recostada na rede da varanda. Acontece que ali tinha um arame do rádio de válvula do Fata sobre o qual a cocota da família costumava se empoleirar. Não demorou muito para a cocota percorrer o fio até o local em que a Nêna estava e fazer cocô dentro da gamela. Neste exato instante, terminou a música do Amado Batista que a Nena estava escutando enquanto pensava no filho do vizinho. Ela não tinha visto que a cocota fez cocô na gamela, levantou, botou o bolo na forma e colocou para assar.
À noite, a bela mesa foi posta; o bolão cresceu que foi uma maravilha, o assado de porco foi um sucesso e a maionese mista de batata-doce com catofla e mandioca ficou um espetáculo. A família se empanturrou e depois da bela ceia todos peidavam, arrotavam e tomavam Kaiser morna esperando pela chegada do Crisquinte. O Crisquinte foi a idéia de algum louco que resolveu dar um apelido ao Papai Noel, porém, com o passar do tempo chamavam o Papai Noel de Crisquinte com o propósito de assustar as crianças, falando que ele tinha uma vara de marmelo e que batia nas crianças que fizessem arte. Mas na casa dos alemães Alves ele só batia no Nêni, porque o Crisquinte, na verdade, era o pai do filho do vizinho, o futuro sogro da Nêna, sacaram? O Nêni apanhava sempre do Papai Noel porque atirava pedras de bodoque em cima da casa do vizinho, que era coberta de zinco, sempre que ele ia sestear depois do meio-dia.
Na hora em que Papai Noel chegou na casa dos Alves, foi uma festança, uma gritaria, uma pulação. Ele deixou o saco encostado no pé de cinamono, e abraçava todo mundo quando veio o “Tenente”, o cachorro da família, que levantou a perna e mijou no saco do bom-velhinho. Papai Noel mostrou que, ao contrário do que rezava a lenda, não tinha lá muita paciência, e deu uma varada no cachorro que chegou a tirar o pelo. Pobre do “Tenente", saiu correndo e, na disparada, virou três copos de cerveja; de quebra, ainda derrubou de cima do banco a bacia de criba que comiam como petisco e foi se esconder debaixo do tanembau.
Conversa vai, conversa vem, e o Papai Noel não parava de empinar o copo. Ele já estava bem faceiro e com uma fala estranha, parecendo que sua língua já não obedecia correto aos comandos, quando a Nêna foi buscar um pedaço de bolo pra fazer as vezes de esponja e, assim, aumentar o nível de sangue na corrente alcoólica do Noel. Por sorte (ou azar) Papai Noel ganhou exatamente o pedaço do bolo que tinha o cocô da cocota, mas como um milagre natalino ele adorou o bolo da futura nora. Ele gostou tanto, mais tanto que pediu a receita para a Nêna e perguntou se o bolo tinha nome. Nena respondeu que ainda não, e então o bom velhinho pediu licença e deu o nome de Banedône, que nada mais era do que uma massa assada feita de açúcar, farinha, ovo, fermento, frutas cristalizadas e cocô de cocota.
A certa altura, Noel já não conseguia mais parar sentado, parecendo um joão-bobo se embalando pra lá e pra cá de tanta cerveja morna que havia tomado. A vizinhança estranhou que bom velhino não aparecia para levar os presentes às crianças e foi até a casa da família Alves. Ao chegarem, se depararam com o Noel vomitando entre as pernas e o “Tenente” lambendo aquilo tudo. “Xá deidááá cusco tescraçado, pára de lampê esta gumitada, ou tu qué ficá cambá também?”, berrou a Relmengarda. Foi uma nojeira tão grande que Noel teve que ser guinchado pelos vizinhos e levado para curar o porre em casa, deixando tristes todas as criancinhas da região. O triste fim desta história também é a quebra surpreendente de um tabu, pois, ao contrário do que todos acreditavam, quando o Papai Noel não aparece na noite de Natal, não é porque as criancinhas não merecem presentes, é porque ele ficou bêbado em alguma festa de que participou. Fim!
PS.: Sinceramente, vocês acham que isso não é motivo para o Papai Noel ficar brabo comigo? Mas mesmo assim, ano que vem vou caprichar ainda mais no texto, por que só eu sei como é difícil agradar o Noel.
PS 2: Ao se encerrar mais um ano, desejo que a luz do Menino Jesus ilumine as estradas de todos e que 2008 seja realmente um ano bom. Que não nos esqueçamos de dedicar um pouquinho de nossa atenção ao aniversariante do dia 25, voltando nossos corações em oração e agradecendo, principalmente, pela vida, que pode ser bem feliz e alegre, basta querer.
Um feliz Natal a todos e que Deus nos ilumine nos dando inspiração e, sobretudo, saúde e paz!
Luís Roberto Alves
Natal de 2007