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25/08/2009 16:56
Por:

Schokolade mit pfeffer

 Como tradicionalmente acontece há mais de um ano, a coluna Chocolate e Pimenta adota o título em deutsch para relembrar certas peripécias vividas (ou talvez mentidas) pelos antepassados alemães do colunista, de sobrenome Richardt, se alguém não sabia. Os Alves, que também são alemães, se diferem um pouco dos demais de origem germânica por causa que vieram de lá com catamarãs austríacos copiados do Sri Lanka, já que eram muito chegados a aventuras, mas isto é história para outra coluna.
Pois os problemas enfrentados pelos imigrantes não eram poucos, a começar pelos mosquitos, também chamados de “bernilonga”. Como ainda não tinham inventado o Boa Noite – aquele espiral no qual que se ateia fogo numa ponta e dá uma fumaceira danada –, o pessoal tinha que se virar do jeito que dava, ou seja, se trancar dentro de casa e deixar a porta do fogão a lenha aberta pra esfumaçar o ambiente. Isso servia não só para espantar os mosquitos como também para defumar as lingüiças e os schinkenspeck que ficavam penduradas num fio de arame sobre o fogão. De manhã, a luta na colônia começava cedo, mas não sem antes tomar um baita dum frühstück. Para isso bastava passar a mão numa perna de linguiça, pegar uns ovos de uma penosa dentro do forno de assar pão e fazer um mexido com banha pra comer com pão de milho e melado. Claro que para ter essas coisas gostosas e saudáves em casa era muito importante cuidar bem dos animais, e como a criação de porcos sempre esteve presente em nossa família, meus antepassados davam uma especial atenção a eles.
E foi justamente em relação à criação que acoteceu um fato pitoresco com meu bisavô. Como o vizinho tinha um cachaço de raça, ele combinou de levar as porcas que tinha na sua propriedade para o vizinho cobrir (o cachaço do vizinho, melhor dizendo). Para aproveitar a viagem, botou na carroceria da Fubica um porco que iria vender para outro vizinho que morava no caminho. Naquela época, não tinha tantos fiscais nas estradas como tem hoje. Esses dias quase que deu um acidente de trânsito lá em Cabrais envolvendo só o pessoal da fiscalização, de tanto carro e gente que tinha envolvida. Mas enfim, outrora vez por outra apareciam os fiscais para atacar o pessoal e ver se eles tinham carteira de motorista e nota fiscal dos bichos. O bisa era chamado também de pissa, porque nós, alemães, temos a mania de trocar o “b” pelo “p” e os “s” ou “z” por dois esses o “f” pelo “v” o “g” pelo “c” e vice-versa, isso sem falar no uso do “x”, o que dava uma confusão danada. Bode era pode, pode era bode, vaca era faca, faca era vaca, calo era galo, galo era calo e por aí vai. Mas isso também não vem ao caso.
Voltando à história do bisa, ele ia tranquilamente pela estradinha sem pedágio quando um fiscal se perfilou no meio, fez sinal pro bisa parar e o bisa parou, amontoando os porcos na carroceria. E logo foi cumprimentando o senhor da lei:
– Pondia seu visgal!
– Bom dia! O senhor poderia me apresentar a nota destes animais?
– Mas que nota o quê, desde quando porco vai pro golégio?
– Olha, o senhor tá brincando comigo, eu quero ver a nota fiscal pra transportar estes porcos.
– Ah, é isto. É que eu não tô vendendo estas porquinha, eu só fô levar pro cajasso da fizinho cobrir!
– Mas isso não dá pra fazer em casa?
– Num tá, meu cajasso já tá velho e procha.
– Mas pelo que eu estou vendo não é só porca que o senhor tem aí, né? O que este porco tá fazendo aí no meio?
E meu bisa, muito do esperto, lascou: – Ah, este porco é a vergonha da minha propriedade. É que ele é meio puto, e toda vez que eu falo que eu vô levá as porca pro cajasso do vizinho ele quer vir xunto.
Por isso que desde aquela época mais nenhum fiscal atacou caminhões e fubicas carregados com porcos, afinal, a orientação sexual dos bichinhos é coisa que não diz respeito aos humanos.
Um feliz dia do colono e do motorista para todos!