Logo Folha de Candelária
25/08/2009 16:56
Por:

Borrachudo x colono

Segunda-feira, 27 de outubro de 2008. O jovem Luís Roberto Alves, repórter, colono, pescador e caçador nas horas vagas, sai de seu principal emprego para dirigir-se ao local em que mora em Novo Cabrais. Chegando lá, dirigiu-se à horta para acompanhar o estado da plantação de tomates após duas semanas de chuvarada. Graças à perspicácia, uma de suas principais peculiaridades, o sombrite colocado estrategicamente sobre o canteiro amainou um pouco os efeitos do tempo, e a caixa de madeira que cercava o canteiro, cuidadosamente elaborada pelo seu sogro fez com que o húmus também não fosse embora. Os frondosos tomateiros não sucumbiram à força das tempestades e ostentam verdejantes frutos que em breve serão servidos em molhos e saladas.
Satisfeito com o que viu, o rapaz notou que ao lado a plantação de moranguinhos estava meio que descuidada. Moranguinho com picão (o inço) não dá certo, ainda mais com urtigas e outras ervas daninhas que nada tinham a ver com a beleza plástica das frutas vermelhas que faziam um contraste ímpar com o amarelo da casca de arroz, colocada estrategicamente de forma a proteger as infrutescências. Acometido de uma súbita vontade reverter aquele quadro, o intrépido rapaz foi à cozinha, onde pegou uma das famosas facas de serrinha sem serrinha de sua sogra e voltou ao quintal para dar um jeito de recuperar a plantação de morangos, não sem antes indagar a si mesmo porque aquilo é chamado de picão; chulamente pensando, concluiu com os próprios botões que, se mantidas as proporções com o diminutivo de picão, aquilo poderia no máximo ser um diminutivo sintético que, desta forma, deveria ser chamado de “piquinha”. Esqueçam disso, por favor, não vai somar nada.
Durante o trabalho, os dedos do jovial repórter, agora na personificação de um colono obstinado, mais pareciam rabanetes brancos recém-colhidos. Nove carreiras depois, o suor já pingava pelo rosto quando seu braço deu de encontro a um urtigueiro com seus frutos capsulares revestidos de pêlos urentes. A sensação foi de ter encostado a canhota numa chaleira de água fervente... por duas vezes, pelo menos. Não bastasse isso, em seguida, um mosquito borrachudo pousou sobre sua orelha esquerda e, encarnando um morcego hematófago tascou-lhe um ferroaço no lóbulo. Não demorou muito para o veneno do inseto fazer efeito e começar a coceira, dando também início a um fenomenal processo de inchaço. Ao levar o braço direito à orelha esquerda, o azarado personagem desta história teve a infelicidade de não ver que este estava coberto de cascas de arroz, logo, uma delas acabou se alojando em seu olho esquerdo.
Com o braço, olho e orelha esquerdos já comprometidos pela ação dos insetos e da flora que não serve para nada, resolveu abandonar o posto, já imaginando que a próxima tragédia poderia lhe trazer problemas ao coração, já que também fica ao lado esquerdo. Em 10 minutos, esvaziou a caixa d’água da residência e mesmo assim não conseguiu tirar o cisco do olho. Não restando-lhe outra saída, foi deitar-se um pouco na vã esperança de amainar a dor e o sofrimento. Uma hora e meia depois, sinais de recuperação: a casca de arroz enfim havia abandonado o olho do mancebo. Porém, ao levantar-se, sentiu a cabeça pendendo para o lado esquerdo. Ao ver-se no espelho, confundiu-se com um Fusca de porta aberta, tamanho o tamanho da orelha. De posse de um destes remédios miraculosos à base de cânfora que prometem até criar dente em galinhas e resolver problemas de fimose, resolveu massagear a orelha, deixando-a mais vermelha que pescoço de galinha polaca. Sorrisinhos sarcásticos dos familiares durante o jantar fizeram com que ele fosse se recolher aos aposentos mais cedo, porém sua esposa, sem dó nem piedade, não deixou que se deitasse antes que tomasse banho e tirasse os picões que se desprenderam anteriormente da roupa e que acabaram se grudando nos lençóis.
Mas como diz o ditado, Deus tira os dentes mas alarga a goela, e a região toda está comentando que a plantação do rapaz tá linda que só vendo. Diz ele que não vai desistir de limpar os carreiros de morangos, mesmo porque ainda faltam onze carreiras. Agora cauteloso como cascudo atravessando galinheiro, irá para a horta levando um SBP e luvas. Ele sabe que vai parecer coisa de fresco, mas não quer de jeito nenhum passar por tudo aquilo novamente. Desejemos sorte ao moço, o mundo precisa de gente deste quilate!