Por: Odete Jochims
O Sabor da Memória : os pratos típicos na construção da identidade cultural
Em meio às paisagens rurais de Candelária, Rio Grande do Sul, um grupo especial de agricultores familiares longevos guarda consigo um tesouro precioso: suas práticas alimentares tradicionais. Esses guardiões da tradição não apenas cultivam a terra, mas também cultivam memórias, histórias e identidades através dos alimentos que preparam e compartilham. Neste artigo, vamos explorar a riqueza dessas práticas alimentares e como elas se entrelaçam com a história, a cultura e a sustentabilidade.
Alfred Schütz, renomado filósofo e sociólogo Austríaco, nos lembra que o conhecimento à mão é aquele adquirido através da experiência direta e da interação com o mundo ao nosso redor. Nas conversas com os agricultores longevos de Candelária, podemos sentir a sabedoria acumulada ao longo de gerações, transmitida não apenas em receitas, mas em gestos, aromas e sabores que contam a história de um povo.
Ao mergulharmos nesse universo gastronômico, nos deparamos com a essência da agricultura familiar e sua importância para a sustentabilidade local. A produção para autoconsumo não é apenas uma questão de nutrição, mas também de preservação da biodiversidade doméstica. Como destacam os estudiosos Zanetti e Menasche, as famílias que cultivam alimentos para si não só garantem sua subsistência, mas também contribuem para a diversidade genética e a adaptabilidade das espécies, fortalecendo assim a base da segurança alimentar.
Contudo, essas práticas ancestrais enfrentam desafios no mundo moderno. A globalização e a industrialização dos alimentos ameaçam a continuidade dessas tradições, enquanto os agricultores familiares lutam para obter recursos e competir em mercados cada vez mais exigentes. O pesquisador Abramovay nos alerta sobre a vulnerabilidade da agricultura familiar diante dessas pressões. Nesse contexto, a preservação e valorização do patrimônio alimentar tornam-se imperativas.
A pesquisa realizada em Candelária revela até o momento que não apenas a importância das práticas alimentares tradicionais, mas também os laços profundos entre alimentação, memória e identidade cultural. Os pratos como churrasco e galinhada não são apenas refeições, são símbolos de união familiar e celebração de tradições enraizadas no tempo. A comida torna-se assim um veículo de conexão com o passado, um elo que une gerações e fortalece o tecido social das comunidades rurais. Como destaca um dos entrevistados durante a pesquisa: "Se é para juntar todo pessoal... é o churrasco ou a galinhada."
Diante desse cenário, é fundamental que políticas públicas sejam implementadas para proteger e promover essas práticas alimentares tradicionais. Festivais gastronômicos, oficinas culinárias e programas educacionais nas escolas podem ser ferramentas poderosas para preservar esse valioso patrimônio imaterial. Ao integrar saberes tradicionais com inovações, podemos garantir não apenas a continuidade dessas tradições, mas também uma alimentação saudável, culturalmente rica e ambientalmente consciente.
Assim, as práticas alimentares dos agricultores familiares longevos de Candelária são muito mais do que simples refeições. São pedaços de história, fragmentos de identidade, gotas de sabedoria ancestral que merecem ser preservadas e celebradas. Que possamos, juntos, saborear o passado, nutrir o presente e cultivar um futuro onde o sabor da memória nunca se perca.
Por: Sobre o Autor: Klaus Vargas Karnopp é Servidor Público Federal lotado no Instituto Federal de Ciência e Tecnologia Farroupilha - Reitoria. Possui um mestrado profissional na linha de pesquisa produção de plantas, pela Universidade de Cruz Alta, Cruz Alta-RS. Doutorando em Práticas Socioculturais e Desenvolvimento Social pela mesma instituição na linha de pesquisa práticas sociais e sociedade contemporânea, onde pesquisa os saberes e as práticas envolvidas na alimentação de agricultores familiares (AF) longevos no município de Candelária/RS.